sexta-feira, 10 de abril de 2009

OS PAVORES DA SEMANA SANTA


Coluna especial do " Jornal O Impacto"
Por: José Wilson Malheiros /
jwmalheiros@hotmail.com


Os paramentos ritualísticos dos padres ficavam roxos. As imagens dos santos, dentro das igrejas, eram escondidas por detrás de panos roxos, o que dava um aspecto de mistério e de pavor.Na sexta santa o som das matracas parecia lúgubre, como se cheirasse a morte e a estupidez, dentro dos templos e nas vias públicas.Em Santarém eu cantava no Coro da Matriz o cantochão, as músicas de Bach e Palestrina e assistia as inacabáveis cerimônias do lava-pés e as celebrações da sexta feira que me enchiam a imaginação com imagens escabrosas de morte e de medo do castigo divino, ainda mais que eram rezadas e cantadas em Latim.Minha vó Aninhas gostava de frequentar as Vias Sacras. Quando chegava em casa ela vinha chorosa, em silêncio, contrita.Na quinta feira santa e na sexta da paixão as pessoas ficavam com cara de velório, não riam, quase nem conversavam nem saíam de casa, não comiam carne, pois tudo o que fizessem era pecado.Ninguém reservava com antecedência, nas agências de viagem, as excursões para as praias, onde a bebida, os bacanais e a luxúria profanam com naturalidade tudo o que outrora era ou parecia ser sagrado, intocável.No dia da paixão as crianças não podiam fazer barulho, de maneira nenhuma. Tínhamos que falar baixo, não podíamos jogar bola, nem ligar o rádio, nem rir ou chorar. Quem ousasse desobedecer a essa férrea disciplina era castigado no sábado de aleluia.Tudo era preparado para nos acachapar com mais do que respeito, pavor.Diziam que na sexta feira santa uma procissão de almas desfilava pelas ruas da cidade e ninguém ousava sair de casa e nem sequer abrir as janelas.Era uma religiosidade doentia, agourenta, psicótica, que não distinguia entre criancinhas e velhos para ameaçar com o fogo do inferno ao menor deslize.O mais estranho de tudo isso é que o povo assumia essa neurose toda e parecia gostar de ser lambado, humilhado, repreendido.Ainda me recordo que todo ano, na frente da casa de meu tio Miguel, era montado um altar onde a procissão do encontro sempre parava para rezar e escutar o lindo canto da Verônica. Todos ficavam emocionados quando ela cantava e exibia em público o Santo Sudário com a face do cristo sofredor. Mas o tempo passou, as mentes mudaram, ficaram mais esclarecidas. Quando comecei a ler a Bíblia, baseado em pesquisas e não no que todo mundo diz, fiquei estarrecido e constatei que muitas das minhas crenças tinham que ser refeitas.Descobri que Maria Madalena nunca foi adúltera e nem prostituta (Ver Evangelho. Nem Lucas 7:38 ou João 8.3 a 11 sequer mencionam qualquer nome de pessoa, ali), que Moisés recebeu nove e não dez mandamentos (Êxodo, 20), que Adão é um mero símbolo, que a cristandade viveu 786 anos sem imagens e não encontrei o nome da Verônica etc. A partir daí passei a me sentir mais liberto, como um prisioneiro que acaba de cumprir uma pena injusta, por erro judiciário, e estou mais feliz.

Redação: depois da colocação com muita honra das colunas do Thompson e José Wilson, em nosso Espaço a audiência chegou aos 750 acessos diário. É mole!