terça-feira, 23 de julho de 2019

Educação integral: dilemas e desafios na disputa de projetos antagônicos


Pesquisa sistematiza resultados de estudos feitos a partir do Procad que envolveram Ufopa, Unir e Unicamp
Educação gratuita, laica e integral como direito universal ou como mercadoria a ser vendida e comprada, atendendo aos interesses do mercado? Essa polaridade enfatizada no questionamento é uma das constatações de uma pesquisa que o professor Anselmo Alencar Colares, da Universidade Federal do Oeste do Pará, está fazendo a partir da sistematização dos estudos realizados em três estados da Amazônia na área da educação, entre os anos de 2014 e 2018, com base na cooperação científica entre a Ufopa, a Universidade Federal de Rondônia (Unir) e a Universidade de Campinas (Unicamp), no âmbito do Programa Nacional de Cooperação Acadêmica (Procad).
A primeira etapa do levantamento foca as pesquisas produzidas na graduação e na pós-graduação da Ufopa. São 67 trabalhos: dissertações de mestrado (25 concluídas e 2 em andamento), trabalhos de conclusão de curso de graduação (7 concluídos e 3 em andamento), atividades de iniciação científica (22 concluídas e 2 em andamento) e pesquisas de pós-doutoramento (3 concluídas).
O Procad, desenvolvido com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), aprovado no ano de 2013, por edital, abriu a possibilidade para o desenvolvimento de projetos conjuntos envolvendo docentes pesquisadores e estudantes de iniciação científica e da pós-graduação.  Apenas dois projetos foram selecionados. Um deles é o que está sendo retratado nesta matéria, com o título “As experiências pedagógicas das políticas de educação integral na Amazônia: rede de pesquisa e formação acadêmica (Unicamp-Unir–Ufopa)”, enfatizando a temática sobre a educação integral nos estados do Pará, Rondônia e Amazonas.
A perspectiva do projeto foi identificar e analisar a situação concreta da política de educação integral, observando as formas conceituais utilizadas, as práticas em desenvolvimento e os desafios encontrados na realidade amazônica.
A partir de resultados preliminares, o estudo mostra a existência de uma confusão no entendimento de educação integral com escolas de tempo integral. Também ressalta a fragilidade das políticas, com a redução ou cortes no financiamento de programas e aponta a importância da formação do professor no processo educativo do aluno em sua integralidade.
Educação como direito X educação como mercadoria
Um aspecto significativo da polaridade na concepção de educação integral são os projetos políticos societários em disputa. Por um lado, a educação é vista como formação humana, e, por outro, a partir das políticas distributivas e compensatórias presentes no ideário neoliberal.
Observa-se o direito à educação fundado no direito a ter direitos, que colocam o foco do processo educativo no sujeito social. E há a visão do direito à educação como direito à mercadoria e à acumulação de capital. “No ideário neoliberal, os sistemas educacionais devem estar subordinados a demandas do mundo do trabalho, no sentido de garantir a empregabilidade. A educação deve oferecer ferramentas para o indivíduo competir. As políticas educacionais devem abarcar as orientações e marcos teóricos baseados na lógica da economia privada: da competição, do lucro e da mensurabilidade”, explica o professor Anselmo.
Segundo ele, é uma polarização interessante para ajudar a sociedade a refletir sobre os fundamentos da educação. “O direito à educação é a base de todos os demais direitos”, completou. De acordo com a pesquisa, entender a educação como “base de todos os direitos” é observar que por ela se tem a leitura da palavra escrita que potencializa a leitura de mundo. Como os direitos estão expressos em textos escritos, se a pessoa não consegue ler, pode desconhecê-los e ser privada deles.
Em disputa estão dois grandes projetos. Um vê a educação como direito e outro como mercadoria. “Vendo a educação como mercadoria, o que entra em cena é a ideia de empregabilidade, de competição, ideia de que não dá para oferecer a mesma coisa para todos. Então, para uns é um tipo de educação que apenas os prepare para execução de tarefas básicas, e para outros, dotados de certas habilidades diferenciadas, a possibilidade não tem limites”, destacou Colares. Assim, de acordo com o professor, mantém-se a separação da sociedade entre aqueles que apenas realizam as tarefas e aqueles que, supostamente, pensam e dão os rumos nas diversas áreas