quarta-feira, 23 de outubro de 2019

Timbó, planta da raiva: estudo revela relação dos Suruwaha com plantas ictiotóxicas da Amazônia

Fonte: UFOPA
“A planta da raiva: timbó e envenenamento nos Suruwaha do Purus” é o título do artigo publicado pelo antropólogo Miguel Aparicio Suárez, professor do Programa de Antropologia e Arqueologia da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), no livro “O uso de plantas psicoativas nas Américas”, lançado este ano pelo Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), por meio da Editora Gramma.
Organizada pelas pesquisadoras Beatriz Caiuby Labate e Sandra Lucia Goulart, a publicação reúne um conjunto de estudos realizados por diversos antropólogos sobre os vários tipos de uso de plantas psicoativas pelas populações indígenas das Américas. “Eles têm uma relação entre sujeitos. Para os povos indígenas as plantas são sujeitos que interagem com a vida humana também. Não é apenas uma relação humano-vegetal, e muito menos uma relação com substâncias apenas químicas ou alucinógenas. São sujeitos interagindo com sujeitos, que são pensados como pessoas”, explica o professor da Ufopa.
O artigo “A planta da raiva” enfoca o timbó (Deguelia sp.), uma planta ictiotóxica usada para pescaria pelos Suruwaha, população indígena de recente contato que habita no interflúvio dos rios Purus e Juruá, no estado do Amazonas. “É um grupo sob proteção da Funai. O entorno da região ainda não tem muitos impactos por enquanto. Acho que mantendo uma política de proteção, os Suruwaha poderão continuar mantendo sua autonomia, mas sem dúvida é uma população bastante vulnerável”, afirma Miguel Aparicio.
“O texto é resultado da pesquisa etnográfica que venho desenvolvendo entre os Suruwaha desde 1995. Pesquiso sobre as plantas venenosas dos Suruwaha, que são basicamente os venenos de pesca, conhecidos como timbós; e os venenos de caça, conhecidos como curares”, explica  Aparicio, que é doutor em Antropologia Social pelo Museu Nacional do Rio de Janeiro e pesquisador do projeto da Unesco “Salvaguarda do Patrimônio Linguístico e Cultural de Povos Indígenas Transfronteiriços e de Recente Contato da Região Amazônica”.
Cultivo de venenos - O timbó é uma leguminosa da qual é extraído um líquido tóxico utilizado em pescarias. Segundo o professor da Ufopa, em toda a Pan-Amazônia há espécies ictiotóxicas, conhecidas como timbós e tinguis, que são utilizadas principalmente em atividades de pesca. Os Suruwaha utilizam uma única espécie de timbó, a Deguelia utilis, que é cultivada pelo grupo, sendo até hoje plantada nos roçados. As raízes são arrancadas e amarradas em feixes, triturados na beira dos igarapés por causa da pescaria. “Eles trituram esses feixes, batendo com paus na beira do igarapé, para conseguir a captura dos peixes por asfixia. Depois o peixe é assado, cozido, moqueado no uso convencional que se tem na Amazônia”.