Câmara aprova por unanimidade fim do voto secreto
Proposta acaba com o voto secreto no Congresso, nas Assembleias Legislativas e nas Câmaras municipais

Parlamentares fazem manifestação no plenário da Câmara
Seis dias após salvar o mandato do
deputado-presidiário Natan Donadon (sem partido-RO) em uma votação
secreta, a Câmara dos Deputados tentou dar nesta terça-feira uma
satisfação à sociedade e aprovou, em segundo turno, por unanimidade, com
452 votos favoráveis, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 349,
que põe fim ao voto secreto para todas as decisões tomadas em sessões
plenárias do Parlamento. A votação em primeiro turno aconteceu há sete
anos, e o texto segue agora para o Senado, onde a tramitação deve
demorar, no mínimo, um mês. Se aprovado pelos senadores, todos os
futuros processos de cassação de mandato parlamentar terão o voto aberto
dos seus colegas.
A decisão de pôr a medida em votação
partiu do presidente da Câmara, Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN). Ainda
pela manhã, ele chegou à Casa informando que pautaria a proposta na
sessão da noite e que informaria aos líderes sua decisão. Henrique
estava emparedado pela decisão do ministro Luís Roberto Barroso, do
Supremo Tribunal Federal, que na segunda-feira suspendeu a decisão da
Câmara que não cassou o mandato de Donadon.
— Esta Casa marcou um passo ao
reencontro da democracia — afirmou o presidente, à noite, ao proclamar o
resultado da sessão em que apenas ele não votou.
Apesar da aprovação da medida, existe na
oposição o temor de que o Senado demore na discussão da proposta, e ela
acabe não sendo votada. O receio aumentou diante da afirmação do líder
do PMDB, Eduardo Cunha (RJ), na tribuna, informando que, após a
aprovação da PEC 349, seu partido não aceitaria votar a PEC 196, que
prevê o voto aberto apenas na cassação de mandato de parlamentares.
— Não vamos fazer o papel de votar duas PECs, sendo a segunda mais restrita. Não vou enganar a opinião pública — afirmou Cunha.
Apesar de ser mais restrita, a PEC 196
já passou pelo Senado, já foi aprovada pela Comissão de Constituição e
Justiça da Câmara, e agora aguarda discussão e votação em comissão
especial, e depois no plenário, em dois turnos. Pelas contas de Henrique
Alves, em duas semanas, a PEC 196 poderá ser pautada para o plenário e,
caso aprovada, entrará em vigor imediatamente.
Desconfiado, o líder da minoria na
Câmara, Nilson Leitão (PSDB-MT), disse, durante a sessão, que os
partidos de oposição exigirão a votação da PEC já aprovada pelo Senado,
que servirá como garantia caso os senadores demorem a analisar a
proposta aprovada ontem pela Câmara:
— Isso é o jogo do Planalto. Vamos
exigir a votação da PEC 196. Porque votar apenas a PEC 349 é “me engana
que eu gosto”. Porque sabe-se lá quando vai votar lá (no Senado).
Antes da votação final pelos deputados, à
noite, o presidente do Senado, Renan Calheiros (DEM-AL), gerando mais
desconfianças, disse que a Câmara deveria ter priorizado a medida mais
restrita (já aprovada pelo Senado) para só depois partir para a mais
ampla, que deverá suscitar debates. :
— Nós já aprovamos a proposta há mais de
um ano. O fundamental seria votar essa matéria primeiro. Ela seria
promulgada em oito dias. E, depois, nós a ampliaríamos.
A proposta votada nesta terça-feira
sofre restrições mesmo entre os parlamentares que defendem o fim do voto
secreto para cassações de mandato. Isso porque a PEC abre o voto dos
parlamentares em situações delicadas, como apreciação de vetos
presidenciais e indicações de ministros do Supremo e do procurador-geral
da República, o que pode gerar, na visão deles, o risco de sofrerem
retaliações por parte do governo e de autoridades do Judiciário. Ainda
durante a reunião de líderes na Câmara, a avaliação final foi que o
Senado terá a oportunidade de fazer alterações na PEC.
Em plenário, muitos deputados diziam que
não era possível votar ontem contra a PEC do Voto Aberto, mesmo
convencidos de que ficarão expostos em algumas situações, como na
apreciação dos vetos presidenciais.
— Curiosamente, alguns colegas passavam
entre as bancadas fazendo comício contra, dizendo que estávamos dando um
tiro no pé — contou o deputado Otavio Leite (PSDB-RJ).
Muitos usaram a tribuna para justificar
por que estiveram ausentes na votação da semana passada. Nesta
terça-feira, dos quatro deputados condenados no caso do mensalão, apenas
Pedro Henry (PP-MT) sentou-se no fundo do plenário e votou. Já Valdemar
Costa Neto (PR-SP) apenas registrou sua presença ainda cedo. O petista
João Paulo Cunha (SP) não registrou presença, e José Genoino (PT-SP)
está de licença médica.
O deputado Chico Alencar (PSOL-RJ), defensor do voto aberto em qualquer situação, ponderou:
— O parlamentar vai pensar duas vezes se
fica bem com o governo, contra sua consciência e contra a sociedade, ou
se fica bem com seu eleitor. É um teste à nossa independência.
Nesta terça-feira, integrantes da Frente
Parlamentar em Defesa do Voto Aberto, criada em 2011, fizeram um ato em
favor da PEC pelos corredores da Câmara e terminaram com a abertura, no
plenário, de uma enorme faixa amarela e preta com o slogan “Voto aberto
Já”. O próprio Henrique Alves posou para fotos ao lado deles afirmando
que seria uma “sessão histórica”.
Durante a sessão, Alves foi criticado
por alguns deputados, como Sílvio Costa (PTB-PE), sugerindo que ele
“estava jogando para a plateia”. Mas, ao iniciar a sessão de ontem, o
presidente foi taxativo:
— Esta Casa não pode vacilar. O Brasil
espera uma resposta que não pode demorar deste Parlamento. Vi esta Casa
se agachar, se levantar, mas não vi um desgaste maior a essa Casa, à sua
credibilidade do que o ocorrido na noite fatídica da quarta-feira. O
mea culpa é de todos nós.
A comissão especial que analisa a PEC
196 se reuniu ontem, mas ainda precisa cumprir prazos para que ela seja
levada ao plenário, o que deve ocorrer no dia 24 de setembro. Integrante
da comissão, o deputado Júlio Delgado (PSB-MG) reclamou da decisão de
privilegiar a PEC 349:
— O mais rápido é votar a PEC 196. É a
resposta que a sociedade quer. Na semana passada, no caso Donadon,
quebraram o vaso. O vaso quebrou, agora não adianta querer colar.
Fonte: O Globo