Mesmo sem entregar BR-163, governo promete ferrovia de R$ 10 bi. E Santarém não será o destino final.
Plano prevê que a ‘Ferrogrão’ siga o
traçado da rodovia, ligando o Mato Grosso ao Pará; promessa era de que a
BR163 estaria asfaltada até 2015, mas, sem a pavimentação, soja
continua a ser exportada por Paranaguá (PR) e Santos (SP) Sem conseguir
entregar a pavimentação de uma rodovia que promete revolucionar o
escoamento de grãos do País, a BR163, o governo decidiu agora assumir
um compromisso bem mais complicado: construir uma ferrovia de 1.140
quilômetros, estimada em R$ 10 bilhões, bem ao lado do traçado da
estrada. O plano prevê que os trilhos comecem a ser lançados em Lucas do
Rio Verde, no coração da soja do Mato Grosso, e avancem rumo ao norte
do País, até chegarem em Itaituba, no Pará, onde está em construção um
polo logístico, nas margens do Rio Tapajós. Na semana passada, o governo
sinalizou que não pretende transformar a “Ferrogrão” em mais um plano
logístico mirabolante e fixou um pagamento de R$ 33,791 milhões para o
consórcio Estação da Luz Participações (EDLP), que elaborou estudos
técnicos para apoiar a elaboração do edital e do leilão da ferrovia. A
avaliação oficial é de que o produtor rural passaria a ter duas opções
para escoar sua carga, a rodovia e a ferrovia, para chegar aos portos da
região Norte do País. Por meio dos rios amazônicos, o caminho ficará
mais curto e, consequentemente, mais barato. A realidade atual, porém, é
bem diferente. Vida real. Para os produtores da região, a promessa era
de que a BR163, em seu trecho paraense, estaria asfaltada até o fim do
ano passado e, diante dessa expectativa, o planejamento era escoar a
maior parte da produção do Mato Grosso por esse caminho. As condições da
estrada, no entanto, não permitiram que essa estratégia se realizasse e
as principais saídas continuarão a ser os Portos de Paranaguá (PR) e
Santos (SP), a mais de 2 mil km de distância. O presidente da Associação
dos Produtores de Soja e Milho do Brasil (Aprosoja), Almir Dalpasquale,
afirmou ainda que o escoamento da produção não evoluiu em relação à
safra passada. “Vamos continuar a escoar a maior parte dos grãos por
caminhões, pelos portos do Sudeste e Sul. O governo não cumpriu a
promessa de entregar a BR163 ao menos asfaltada e maior parte da
produção não vai sair pelos portos do Arco Norte, como planejávamos”,
afirmou. Dados do Ministério da Agricultura apontam que, mesmo com todas
as dificuldades, o agronegócio tem buscado as rotas do Norte. Há cinco
anos, 8% do total de soja e milho destinado ao mercado internacional
saia pela região. No ano passado, os embarques chegaram a 20%. A maior
parte desse volume, no entanto, foi obrigada a sair por outras vias que
não a BR163. Entre a promessa de uma nova ferrovia e a conclusão da
estrada, os produtores cobram a solução mais imediata, que é a conclusão
do asfaltamento da BR163. A obra foi retomada e, até agora, estava a
cargo do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit).
Porém, o trecho foi incluído na lista de vias a serem concedidas na
segunda etapa do Programa de Investimentos em Logística (PIL), anunciado
em meados de 2015. A entrada da rodovia no plano de concessões foi o
argumento que faltava ao Dnit para deixar de lado as obras, que vinham
dragando os poucos recursos que a autarquia ainda detém. O setor privado
não abre mão do apoio estatal. “Queremos que os contratos do Dnit sejam
mantidos e depois repassados ao concessionário”, disse o presidente
/executivo da Associação Nacional de Usuários de Transportes (Anut),
Luis Henrique Teixeira Baldez. Pedágio. Além da interrupção das obras,
os transportadores estão preocupados com o valor da tarifa de pedágio
prevista para a rodovia, depois de concedida. A proposta do governo
prevê tarifa de até R$ 22,30 na praça de Novo Progresso (PA). Se
percorrer todo o trecho concedido, o gasto chegará a R$ 98,10. Esses são
preços para carros de passeio, mas caminhões pagarão mais. Além disso,
os valores são de janeiro de 2015. Atualizado, o gasto nas sete praças
de pedágio previstas no trecho chega a R$ 110,00. O governo calculou um
preço alternativo, mais baixo, considerando que haverá redução do
tráfego caso a ferrovia seja mesmo construída. Nesse caso, o pedágio
máximo passará de R$ 10,05 para R$ 9,73 para cada 100 km. “É
praticamente o mesmo preço”, disse Baldez. A Anut pretende propor ao
governo que reveja totalmente o modelo dessa concessão. A entidade
defende que a previsão de duplicar o trecho seja excluída do cálculo da
tarifa, o que reduziria o preço a praticamente metade. O contrato
contemplaria um gatilho, que seria acionado em caso de a demanda
aumentar demais. O governo já sinalizou que esse deve ser mesmo o
caminho a ser seguido. “Do jeito que está, o usuário está pagando por
uma duplicação que pode ficar ociosa”, disse Baldez. “É jogar dinheiro
fora.” Procurado pela reportagem, o Ministério dos Transportes não se
manifestou até o fechamento desta matéria.
Fonte: Estadão