O STF cometeu uma "mutilação inconstitucional" ao redefinir a expressão “trânsito em julgado”
O Supremo Tribunal Federal cometeu uma
“mutilação inconstitucional” ao redefinir a expressão “trânsito em
julgado” ao permitir a execução antecipada da pena depois da confirmação
da condenação por uma decisão de segundo grau.
A opinião é do Conselho Federal da Ordem
dos Advogados que protocolou ação na qual pede que o Supremo Tribunal
Federal reconheça a constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal, com redação dada pela Lei 12.403/11, que prevê a prisão somente após o trânsito em julgado.
“Tal dispositivo, encontra-se umbilicalmente ligado ao princípio da presunção de inocência, esculpido no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição,
segundo o qual ninguém será considerado culpado até o trânsito em
julgado de sentença penal condenatória”, diz trecho da petição assinada
pelo presidente da OAB, Cláudio Lamachia, e pelos advogados Lenio Luiz
Streck,André Karam Trindade e Juliano Breda.
Esta é a segunda ação que pede que a corte suprema reconheça a constitucionalidade do dispositivo do CPP. No dia 18/5, o Partido Ecológico Nacional também ajuizou Ação Declaratória de Constitucionalidade no mesmo sentido.
Em sua ação, a OAB alega que o Supremo
Tribunal Federal utilizou um argumento equivocado julgar o Habeas Corpus
126.292, no qual mudou seu entendimento e admitiu a execução antecipada
da pena. Segundo a entidade, o STF argumentou que “em país nenhum do
mundo, depois de observado o duplo grau de jurisdição, a execução de uma
condenação fica suspensa, aguardando referendo da Corte Suprema”.
Contudo, a OAB aponta que a Constituição de nenhum desses países traz a
concepção de presunção de inocência como a prevista no artigo 5º, inciso LVII, da Constituição brasileira.
Outro equívoco apontado pela OAB no julgamento do HC 126.292 é o fato de o artigo 283 do Código de Processo Penal
não ter sido declarado inconstitucional e, para a Ordem, nem poderia.
“Caso uma norma infraconstitucional reproduza, repita, copie o teor de
uma norma constitucional, então o que se verificará é sua
constitucionalidade espelhada. É precisamente isso que se verifica no
caso do dispositivo legal cuja constitucionalidade pretende seja
declarada”, diz.
Além do reconhecimento da constitucionalidade do dispositivo do CPP,
a OAB concessão de medida cautelar para determinar a suspensão da
execução antecipada da pena de todos os casos baseados no julgamento do
HC 126.292. “Os juízes e os tribunais estão vinculado à lei, de maneira
que, fora dessas hipóteses sua atuação será arbitrária e sua decisão
inconstitucional”.
Conforme a petição inicial, todas essas
decisões que determinaram a execução antecipada da pena, com fundamento
no HC 126.292, são nulas por violarem a competência relativa ao
exercício do controle difuso de constitucionalidade das leis nos
tribunais.
“Ao optar por simplesmente deixar de aplicar o artigo 283 do Código de Processo Penal,
os órgãos fracionários incorrem em flagrante usurpação da competência
do plenário para julgar questões constitucionais incidentais,
contrariando, expressamente, a Súmula Vinculante 10, editada em resposta
ao drible hermenêutico frequentemente praticado nos tribunais à
cláusula da reserva de plenário, também conhecida como full bench,
insculpida no artigo 97 da Constituição.
Na verdade, os órgãos fracionários dos tribunais até podem entender que
a execução antecipada da pena deve prevalecer sobre a presunção de
inocência, mas desde que superem – e não contornem! – pela via adequada o
obstáculo representado pelo artigo 283 do Código de Processo Penal“, argumenta a OAB.
Superinterpretação da norma
Para a Ordem dos Advogados do Brasil, o
Supremo Tribunal Federal fez uma superinterpretação da norma. Ou seja,
uma leitura inadequada, caracterizada pela ultrapassagem dos limites
semânticos do texto, prevalecendo a imposição da vontade do leitor. Ao
fazer isso, a OAB afirma que o Supremo “operou uma verdadeira alteração
do texto constitucional (…) sob o álibi da efetividade processual,
voltada à instituição de uma verdadeira política judiciária que deverá
orientar a atuação dos tribunais nos casos futuros, incluindo os
processos da operação lava jato”.
“Com efeito, ao criar um novo – e jamais
pensado – sentido para a expressão ‘trânsito em julgado’, a Suprema
Corte reescreveu a Constituição e aniquilou uma garantia fundamental,
revelando todo seu viés realista. Isso porque, na comunidade jurídica,
ninguém tem dúvida acerca de seu sentido. Todos sabem o que é sentença
condenatória transitada em julgado”, complementa a entidade.
Fonte: OAB Nacional e Jornal Jurid