Jornal O Impacto: Dom Flávio, qual sua avaliação até o momento do 99º Círio de Nossa Senhora da Conceição?
Dom Flávio: Até agora
eu acho que está sendo muito bom. Foi tudo bem preparado, nós sempre
procuramos pegar a experiência dos anos anteriores para ver o que
precisa se corrigir. Tanto no sentido de erros, como também de
atualizar, porque a tradição tem de ser mantida. O Papa Francisco tem
uma frase muito bonita de como ele define tradição: “Tradição não é
adorar cinzas, e sim passar o fogo adiante, mantendo o fogo aceso”. Como
quando tem a corrida, que um passa o bastão para o outro. Então, é isso
que queremos fazer, a cada ano dizer como é que podemos ajudar a
manifestação da fé, não mais nos moldes de 1980 ou do ano 2000, agora
estamos em 2017, então, como é que vamos vivenciar a fé? Por isso as
homenagens e a velocidade do Círio. Uma coisa era quando o Círio era de
50 mil pessoas, outra coisa é agora com 200 mil. Mas até agora eu penso
que estamos indo bem e atentos a corrigir eventuais falhas ou descuidos,
nós vamos até anotando alguma coisa para corrigir agora e outras coisas
a prever para o próximo ano.
Jornal O Impacto: Uma das coisas
que notamos, foi com relação à diversificação dos preços dos pratos que
são servidos na Barraca da Santa nas festividades. Como são feitos?
Dom Flávio: Notamos que
na Barraca da Santa o preço era único, pois eram servidos pratos
completos, na base de 20 a 22 reais, que era relativamente um preço
comercial. Mas pensamos, uma família que vem para as festividades com 4
ou 5 pessoas, iria gastar 100 reais ou mais, nem todo mundo tem essa
possibilidade e nem todos querem comer à noite um prato como uma galinha
caipira, pato no tucupi, ou seja, um prato completo, alguns se
contentam com um pastel, outros com uma fatia de pizza. Então, nesse ano
decidimos que na Barraca da Santa tivessem várias opções, de maneira de
quem quiser comer pouco de fato irá comer pouco e vai ter a
possibilidade de estar na Barraca da Santa. Por exemplo, eu gosto de
pastel, de vez em quando tomava uma suco de laranja com pastel nas
outras barraquinhas e vou continuar fazendo isso. Mas, também, é gostoso
poder dizer que eu quero um pastel ou “churrasquinho de gato” da
Barraca da Santa. Então, fizemos a diversificação.
Jornal O Impacto: Mudando um
pouco de assunto, é nítido e notório que o Bispo Dom Flávio tem um
carinho todo especial pelas crianças. Em qualquer evento que você vê o
Bispo, pode-se notar sua química com as crianças. Porém, em Santarém
vivemos uma triste realidade, que é a presença constante de crianças
próximo aos semáforos, famílias de refugiados que estão presentes nesses
locais. Gostaríamos de saber qual sua visão com relação a essa
situação, principalmente com relação às crianças?
Dom Flávio: Os
refugiados que estão em Santarém não é porque decidiram migrar e sim por
situação de fome. Eles têm outra situação além da fome, uma
peculiaridade diferenciada porque são indígenas, os que estão aqui não
são venezuelanos miscigenados como a maioria da população da Venezuela e
também aqui do Brasil, que inclusive têm até dificuldade de falar
espanhol. Outra situação é que não se trata de uma tribo organizada, com
cacique e tudo mais, na realidades deles é cada um por si, cada um tem
de se virar. Vieram juntos em uma embarcação, mas depois foi cada um
para o seu lado. Agora, em relação ao pedido de esmola, isto é uma coisa
muito chata em qualquer situação, porque sabemos que têm algumas
pessoas que precisam e até com vergonha vêm pedir ajuda, mas tem gente
que faz isso de profissão e estes indígenas fazem esse tipo de
atividade, tanto na Venezuela, como em Boa Vista, Roraima, Manaus, Belém
e agora aqui. Com relação às crianças, tem duas situações, as mães
quando saem claramente não vão deixar as crianças em casa ou onde estão
alojados, ao mesmo tempo tem também a suposta exploração das crianças.
Se você vê um adulto, dificilmente ajuda, mas se vê uma uma criança, o
coração não aguenta, o coração fica até apertado de não ajudar. Minha
opinião é que essa situação dever ser trabalhada como vem sendo feito
pelo Ministério Público, pela Prefeitura, mas se eles estão no Brasil,
têm de se adaptar às regras do Brasil. Com relação aos semáforos
especificamente, eu vejo que eles pedem mais aqui perto dos bancos, nos
sinais tem muito hippie, e no sinal de trânsito próximo à rodoviária.
São nesses que tem meninos brasileiros, que estão sistematicamente
pedindo isso; só meninos, não tem nenhum adulto. Eu não sei por que, se
fossem escoteiros que estivessem ali teriam umas faixas, uniformizados.
Então, ontem (27/11) me deparei com essa situação às cinco da tarde e
meninos bem arrumadinhos, acho que tem alguém mandando eles, se
aproveitando da situação e não são venezuelanos. Esse fator dos pedintes
ou de várias situações mais sobre as crianças, aproveito o momento para
falar, depois irei ligar para o Conselho Tutelar para ver que crianças
são aquelas que estão lá, porque à tarde quando se passa por ali quase
sempre tem meninos pedindo, mas o Conselho Tutelar deve averiguar isso.
Jornal O Impacto: Semana passada
houve um assunto que gerou polêmica na internet, nas redes sociais e
que também foi pauta do Jornal O Impacto. Estamos nos referindo à
opinião do professor Ivan Sadeck, com relação à nova programação que é
adotada pela Rádio Rural de Santarém e que gerou muitas opiniões. Qual
sua visão com relação às afirmações do professor Ivan Sadeck e também
sobre a nova programação?
Dom Flávio: Sobre a
programação, é o seguinte: em 2013, portanto, há quatro anos, eu estava
nos primeiros meses e quem era diretor da Rádio era o Padre Edilberto
Sena, com muita capacidade e ideias e em um certo momento o Padre
Edilberto me apresentou uma pesquisa que ele tinha mandado fazer, sobre
audiência, quantos são os ouvintes de uma emissora com relação a outra e
etc. Ele estava muito para baixo, quando me apresentou isso, porque há
10 anos mandei fazer a mesma pesquisa e nós estávamos com 40% e agora
olhe o resultado. Em 2013 nós tínhamos caído de 40%, primeira posição no
interior para apenas 5% e na cidade de 40% também naquela época para
14%. Então, ele dizia: “como é que perdemos em 10 anos 26% na cidade e
35% no interior?”. Isso é situação de falência de audição, e alguns
meses depois por motivo de compromissos pessoais, ele me pediu que fosse
substituído. Então, entrou primeiro o Padre Auricélio Paulino, que por
motivo de doença foi substituído pela Rosa Rodrigues, sendo que ficou na
Rádio até que foi chamada quando passou no concurso da UFOPA. Depois,
entrou o Padre Ademar e por último entrou o Padre Walter, que é também o
administrador da Diocese. Então, nos primeiros anos eu logo contratei
uma firma de São Paulo, que veio aqui para olhar a administração da
Diocese, mas eu também falei para verem a Rádio Rural. Essa firma é
especializada em recuperar firmas à beira da falência. Eles olharam,
fizeram suas análises e depois de uma conversa, fizeram uma proposta,
pois diante da pesquisa que o Padre Edilberto havia feito os ouvintes
diziam que a Rádio Rural tinha parado no tempo. Estava na hora e
precisava renovar, então, a solução que esta firma propôs para salvar a
Rádio, era demitir todo mundo, fazer uma limpeza interna; segundo,
renovar a grade e, terceiro acabar com dezoito ou vinte departamentos,
como se fosse uma mega Rádio, maior que a Tupy ou a Globo. Nós dissemos
que era chato e complicado para as famílias perderem o emprego, então,
vamos ver se renovamos. Primeiramente, fizemos a limpeza do
departamento, uma reorganização administrativa, pensado na época do
Padre Auricélio, mas construído na época com ajuda e com o jeito da
professora Rosa Rodrigues. Depois fomos começar a estudar uma nova
programação, fizemos muitas reuniões internas em grupo, como
individuais, tanto que colocamos Hélcio Santos para ser diretor de
programação, mas quando se falava com os funcionários e animadores, a
maioria dizia: “precisamos mudar, precisamos mudar, mas não mexam no meu
programa”. Se a culpa não era do departamento administrativo, ninguém
assumia o fato de dizer, muda o departamento comercial e se não
conseguir vender alguma coisa é por causa também da programação. Era
aquilo que já tinham falado os ouvintes, que a rádio estava parada no
tempo. Então, eu respeito aqueles que dizem: “quando é que vão dar o
atestado do óbito?”. Eu digo não, o atestado de óbito já havia sido
assinado no dia 10 de julho de 2013, ou seja, há quatro anos. Nós
estamos tentando salvar, agora vai ser necessário mudar alguns
programas, até porque os salários da Rádio Rural estão bem acima da
média do Sindicato, não tem como sustentar uma realidade desta. Vamos
ter de mudar e é melhor errar tentando do que errar parado. Parados,
continuando assim, seria a morte certa. Então, estamos mudando para
salvar a Rádio Rural.
Jornal O Impacto: Um dos
assuntos de maior questionamento em nosso site é com relação ao
seminário São Pio Décimo, alguns dizem vai ser vendido, outros dizem que
não. Tirando essa dúvida de uma vez por todas, qual a real situação?
Dom Flávio: Em
fevereiro deste ano fomos procurados por uma firma imobiliária dizendo
que a UFOPA mandou carta para as imobiliárias procurando terreno para
alugar ou comprar, por conta de sua fase de expansão e a previsão para o
Campus Tapajós, mesmo construindo novos prédios, é que em pouco tempo
vão estar entupidos. Está terminando também o aluguel do Boulevard e
diante dessa situação queriam ver outras propostas. Então, perguntaram
se nós estávamos dispostos a entrar na negociação; Fizemos avaliação com
o Conselho Presbiteral, porque aquele prédio todo foi pensado e
organizado para 150 pessoas, nós temos o uso de 23 este ano e para o
próximo ano a previsão está ao redor de 30. É um espaço enorme, e
estamos pensando como adaptar aquilo para um centro de convenções, uma
casa de retiro como é em Emaús, fazendo uma segunda aqui. Entramos com a
negociação em abril, eles disseram que o Conselho já estava certo e
pediram para liberar o prédio no final de maio. No final de maio não foi
possível, deixamos para o final de julho e concordaram, porque pra nós
depois vinham as férias e aí pronto, foi isso que foi feito. Mas depois
houve burocracias, uma coisa ou outra, opiniões internas da própria
UFOPA, onde consequentemente atrasou muito. Em que pés estamos agora?
Nas negociações se viu a inviabilidade de ser alugado, porque se fosse
para alugar nós deveríamos assumir todas as reformas para que o prédio
fosse adaptado para as exigências da UFOPA e seria um gasto muito alto
que nós não teríamos condições de fazer, então, aceitamos a proposta
deles de uma eventual compra. Agora, o problema está com o MEC, e também
no Clero a opinião não concorda, alguns acham que sim e outros que não.
Deixe ali e vamos procurar outras formas de levar para frente, porque é
um gasto a manutenção de toda aquela estrutura, e o custo per capta dos
seminaristas, precisaríamos mudar de qualquer jeito. Não se pode pensar
em voltar pra lá eventualmente do mesmo jeito que era, atualmente os
seminaristas moram em duas casas alugadas e vamos ver agora qual a
resposta, o problema é que o tempo está passando e vai ter na próxima
terça-feira a eleição da nova Reitoria e não sei no que vai dar. Eu
entreguei nas mãos de Deus. Em setembro, nós batemos o martelo e
aceitamos a proposta, mas de lá para cá eu disse: “se for para vender o
Senhor irá fazer as coisas fluírem, se não for para vender é só deixar o
burocracia travar tudo”. Eu não sou daqui, estou há apenas cinco anos,
mas não deixa de ser um problema, se desfazer de um patrimônio que é
espiritual e cultural. Agora, a vantagem que muita gente diz, mesmos os
alunos, que tem alguns a favor e outros não, é que não está sendo
vendido para ser um motel ou outra coisa, está sendo vendido para um
serviço educativo, pois quando a estrutura foi criada como um Seminário
menor, todo mundo sabia que a maioria ali não iria ser padre, era mais
um serviço social para adolescentes de famílias simples e que com a
ajuda da qualidade do estudo no Seminário poderiam construir uma vida
bem melhor. Então, o Seminário da Amazônia foi feito com essa
perspectiva de um serviço social e se de vez em quando escapasse alguma
vocação, melhor ainda. Podemos dizer que a finalidade principal seria
mantida, em uma dimensão social e educativa. Mas se não for para ser
vendido, veremos como retomar o primeiro projeto que era encontrar
verbas para adaptar aquilo para um Centro de Convenções especialmente
para nós, centrados na espiritualidade, nos finais de semana. Mas no
meio da semana seria aberto para firmas e pessoas interessadas em
encontros, reuniões e tudo mais.
Por: Allan Patrick
Fonte: RG 15/O Impacto