sexta-feira, 1 de dezembro de 2017

Bispo de Santarém abre a caixa-preta da Rádio Rural

Jornal O Impacto: Dom Flávio, qual sua avaliação até o momento do 99º Círio de Nossa Senhora da Conceição?
Dom Flávio: Até agora eu acho que está sendo muito bom. Foi tudo bem preparado, nós sempre procuramos pegar a experiência dos anos anteriores para ver o que precisa se corrigir. Tanto no sentido de erros, como também de atualizar, porque a tradição tem de ser mantida. O Papa Francisco tem uma frase muito bonita de como ele define tradição: “Tradição não é adorar cinzas, e sim passar o fogo adiante, mantendo o fogo aceso”. Como quando tem a corrida, que um passa o bastão para o outro. Então, é isso que queremos fazer, a cada ano dizer como é que podemos ajudar a manifestação da fé, não mais nos moldes de 1980 ou do ano 2000, agora estamos em 2017, então, como é que vamos vivenciar a fé? Por isso as homenagens e a velocidade do Círio. Uma coisa era quando o Círio era de 50 mil pessoas, outra coisa é agora com 200 mil. Mas até agora eu penso que estamos indo bem e atentos a corrigir eventuais falhas ou descuidos, nós vamos até anotando alguma coisa para corrigir agora e outras coisas a prever para o próximo ano.
Jornal O Impacto: Uma das coisas que notamos, foi com relação à diversificação dos preços dos pratos que são servidos na Barraca da Santa nas festividades. Como são feitos?
Dom Flávio: Notamos que na Barraca da Santa o preço era único, pois eram servidos pratos completos, na base de 20 a 22 reais, que era relativamente um preço comercial. Mas pensamos, uma família que vem para as festividades com 4 ou 5 pessoas, iria gastar 100 reais ou mais, nem todo mundo tem essa possibilidade e nem todos querem comer à noite um prato como uma galinha caipira, pato no tucupi, ou seja, um prato completo, alguns se contentam com um pastel, outros com uma fatia de pizza. Então, nesse ano decidimos que na Barraca da Santa tivessem várias opções, de maneira de quem quiser comer pouco de fato irá comer pouco e vai ter a possibilidade de estar na Barraca da Santa. Por exemplo, eu gosto de pastel, de vez em quando tomava uma suco de laranja com pastel nas outras barraquinhas e vou continuar fazendo isso. Mas, também, é gostoso poder dizer que eu quero um pastel ou “churrasquinho de gato” da Barraca da Santa. Então, fizemos a diversificação.
Jornal O Impacto: Mudando um pouco de assunto, é nítido e notório que o Bispo Dom Flávio tem um carinho todo especial pelas crianças. Em qualquer evento que você vê o Bispo, pode-se notar sua química com as crianças. Porém, em Santarém vivemos uma triste realidade, que é a presença constante de crianças próximo aos semáforos, famílias de refugiados que estão presentes nesses locais. Gostaríamos de saber qual sua visão com relação a essa situação, principalmente com relação às crianças?
Dom Flávio: Os refugiados que estão em Santarém não é porque decidiram migrar e sim por situação de fome. Eles têm outra situação além da fome, uma peculiaridade diferenciada porque são indígenas, os que estão aqui não são venezuelanos miscigenados como a maioria da população da Venezuela e também aqui do Brasil, que inclusive têm até dificuldade de falar espanhol. Outra situação é que não se trata de uma tribo organizada, com cacique e tudo mais, na realidades deles é cada um por si, cada um tem de se virar. Vieram juntos em uma embarcação, mas depois foi cada um para o seu lado. Agora, em relação ao pedido de esmola, isto é uma coisa muito chata em qualquer situação, porque sabemos que têm algumas pessoas que precisam e até com vergonha vêm pedir ajuda, mas tem gente que faz isso de profissão e estes indígenas fazem esse tipo de atividade, tanto na Venezuela, como em Boa Vista, Roraima, Manaus, Belém e agora aqui. Com relação às crianças, tem duas situações, as mães quando saem claramente não vão deixar as crianças em casa ou onde estão alojados, ao mesmo tempo tem também a suposta exploração das crianças. Se você vê um adulto, dificilmente ajuda, mas se vê uma uma criança, o coração não aguenta, o coração fica até apertado de não ajudar. Minha opinião é que essa situação dever ser trabalhada como vem sendo feito pelo Ministério Público, pela Prefeitura, mas se eles estão no Brasil, têm de se adaptar às regras do Brasil. Com relação aos semáforos especificamente, eu vejo que eles pedem mais aqui perto dos bancos, nos sinais tem muito hippie, e no sinal de trânsito próximo à rodoviária. São nesses que tem meninos brasileiros, que estão sistematicamente pedindo isso; só meninos, não tem nenhum adulto. Eu não sei por que, se fossem escoteiros que estivessem ali teriam umas faixas, uniformizados. Então, ontem (27/11) me deparei com essa situação às cinco da tarde e meninos bem arrumadinhos, acho que tem alguém mandando eles, se aproveitando da situação e não são venezuelanos. Esse fator dos pedintes ou de várias situações mais sobre as crianças, aproveito o momento para falar, depois irei ligar para o Conselho Tutelar para ver que crianças são aquelas que estão lá, porque à tarde quando se passa por ali quase sempre tem meninos pedindo, mas o Conselho Tutelar deve averiguar isso.
Jornal O Impacto: Semana passada houve um assunto que gerou polêmica na internet, nas redes sociais e que também foi pauta do Jornal O Impacto. Estamos nos referindo à opinião do professor Ivan Sadeck, com relação à nova programação que é adotada pela Rádio Rural de Santarém e que gerou muitas opiniões. Qual sua visão com relação às afirmações do professor Ivan Sadeck e também sobre a nova programação?
Dom Flávio: Sobre a programação, é o seguinte: em 2013, portanto, há quatro anos, eu estava nos primeiros meses e quem era diretor da Rádio era o Padre Edilberto Sena, com muita capacidade e ideias e em um certo momento o Padre Edilberto me apresentou uma pesquisa que ele tinha mandado fazer, sobre audiência, quantos são os ouvintes de uma emissora com relação a outra e etc. Ele estava muito para baixo, quando me apresentou isso, porque há 10 anos mandei fazer a mesma pesquisa e nós estávamos com 40% e agora olhe o resultado. Em 2013 nós tínhamos caído de 40%, primeira posição no interior para apenas 5% e na cidade de 40% também naquela época para 14%. Então, ele dizia: “como é que perdemos em 10 anos 26% na cidade e 35% no interior?”. Isso é situação de falência de audição, e alguns meses depois por motivo de compromissos pessoais, ele me pediu que fosse substituído. Então, entrou primeiro o Padre Auricélio Paulino, que por motivo de doença foi substituído pela Rosa Rodrigues, sendo que ficou na Rádio até que foi chamada quando passou no concurso da UFOPA. Depois, entrou o Padre Ademar e por último entrou o Padre Walter, que é também o administrador da Diocese. Então, nos primeiros anos eu logo contratei uma firma de São Paulo, que veio aqui para olhar a administração da Diocese, mas eu também falei para verem a Rádio Rural. Essa firma é especializada em recuperar firmas à beira da falência. Eles olharam, fizeram suas análises e depois de uma conversa, fizeram uma proposta, pois diante da pesquisa que o Padre Edilberto havia feito os ouvintes diziam que a Rádio Rural tinha parado no tempo. Estava na hora e precisava renovar, então, a solução que esta firma propôs para salvar a Rádio, era demitir todo mundo, fazer uma limpeza interna; segundo, renovar a grade e, terceiro acabar com dezoito ou vinte departamentos, como se fosse uma mega Rádio, maior que a Tupy ou a Globo. Nós dissemos que era chato e complicado para as famílias perderem o emprego, então, vamos ver se renovamos. Primeiramente, fizemos a limpeza do departamento, uma reorganização administrativa, pensado na época do Padre Auricélio, mas construído na época com ajuda e com o jeito da professora Rosa Rodrigues. Depois fomos começar a estudar uma nova programação, fizemos muitas reuniões internas em grupo, como individuais, tanto que colocamos Hélcio Santos para ser diretor de programação, mas quando se falava com os funcionários e animadores, a maioria dizia: “precisamos mudar, precisamos mudar, mas não mexam no meu programa”. Se a culpa não era do departamento administrativo, ninguém assumia o fato de dizer, muda o departamento comercial e se não conseguir vender alguma coisa é por causa também da programação. Era aquilo que já tinham falado os ouvintes, que a rádio estava parada no tempo. Então, eu respeito aqueles que dizem: “quando é que vão dar o atestado do óbito?”. Eu digo não, o atestado de óbito já havia sido assinado no dia 10 de julho de 2013, ou seja, há quatro anos. Nós estamos tentando salvar, agora vai ser necessário mudar alguns programas, até porque os salários da Rádio Rural estão bem acima da média do Sindicato, não tem como sustentar uma realidade desta. Vamos ter de mudar e é melhor errar tentando do que errar parado. Parados, continuando assim, seria a morte certa. Então, estamos mudando para salvar a Rádio Rural.
Jornal O Impacto: Um dos assuntos de maior questionamento em nosso site é com relação ao seminário São Pio Décimo, alguns dizem vai ser vendido, outros dizem que não. Tirando essa dúvida de uma vez por todas, qual a real situação?
Dom Flávio: Em fevereiro deste ano fomos procurados por uma firma imobiliária dizendo que a UFOPA mandou carta para as imobiliárias procurando terreno para alugar ou comprar, por conta de sua fase de expansão e a previsão para o Campus Tapajós, mesmo construindo novos prédios, é que em pouco tempo vão estar entupidos. Está terminando também o aluguel do Boulevard e diante dessa situação queriam ver outras propostas. Então, perguntaram se nós estávamos dispostos a entrar na negociação; Fizemos avaliação com o Conselho Presbiteral, porque aquele prédio todo foi pensado e organizado para 150 pessoas, nós temos o uso de 23 este ano e para o próximo ano a previsão está ao redor de 30. É um espaço enorme, e estamos pensando como adaptar aquilo para um centro de convenções, uma casa de retiro como é em Emaús, fazendo uma segunda aqui. Entramos com a negociação em abril, eles disseram que o Conselho já estava certo e pediram para liberar o prédio no final de maio. No final de maio não foi possível, deixamos para o final de julho e concordaram, porque pra nós depois vinham as férias e aí pronto, foi isso que foi feito. Mas depois houve burocracias, uma coisa ou outra, opiniões internas da própria UFOPA, onde consequentemente atrasou muito. Em que pés estamos agora? Nas negociações se viu a inviabilidade de ser alugado, porque se fosse para alugar nós deveríamos assumir todas as reformas para que o prédio fosse adaptado para as exigências da UFOPA e seria um gasto muito alto que nós não teríamos condições de fazer, então, aceitamos a proposta deles de uma eventual compra. Agora, o problema está com o MEC, e também no Clero a opinião não concorda, alguns acham que sim e outros que não. Deixe ali e vamos procurar outras formas de levar para frente, porque é um gasto a manutenção de toda aquela estrutura, e o custo per capta dos seminaristas, precisaríamos mudar de qualquer jeito. Não se pode pensar em voltar pra lá eventualmente do mesmo jeito que era, atualmente os seminaristas moram em duas casas alugadas e vamos ver agora qual a resposta, o problema é que o tempo está passando e vai ter na próxima terça-feira a eleição da nova Reitoria e não sei no que vai dar. Eu entreguei nas mãos de Deus. Em setembro, nós batemos o martelo e aceitamos a proposta, mas de lá para cá eu disse: “se for para vender o Senhor irá fazer as coisas fluírem, se não for para vender é só deixar o burocracia travar tudo”. Eu não sou daqui, estou há apenas cinco anos, mas não deixa de ser um problema, se desfazer de um patrimônio que é espiritual e cultural. Agora, a vantagem que muita gente diz, mesmos os alunos, que tem alguns a favor e outros não, é que não está sendo vendido para ser um motel ou outra coisa, está sendo vendido para um serviço educativo, pois quando a estrutura foi criada como um Seminário menor, todo mundo sabia que a maioria ali não iria ser padre, era mais um serviço social para adolescentes de famílias simples e que com a ajuda da qualidade do estudo no Seminário poderiam construir uma vida bem melhor. Então, o Seminário da Amazônia foi feito com essa perspectiva de um serviço social e se de vez em quando escapasse alguma vocação, melhor ainda. Podemos dizer que a finalidade principal seria mantida, em uma dimensão social e educativa. Mas se não for para ser vendido, veremos como retomar o primeiro projeto que era encontrar verbas para adaptar aquilo para um Centro de Convenções especialmente para nós, centrados na espiritualidade, nos finais de semana. Mas no meio da semana seria aberto para firmas e pessoas interessadas em encontros, reuniões e tudo mais.
Por: Allan Patrick

Fonte: RG 15/O Impacto