
Dirceu Frederico, presidente da Anoro, faz sérias revelações sobre a compra de ouro na região
Foi com uma conversa de quase quarenta
minutos, muito esclarecedora, ao jornalista Jota Parente, a respeito do
um assunto da maior relevância para a vida do município de Itaituba, na
qual o empresário Dirceu Frederico Sobrinho, presidente da Associação
Nacional do Ouro (ANORO), discorreu sobre problemas e soluções dessa
atividade, onde ele está envolvido há mais de trinta anos. Inicialmente,
Dirceu fez algumas observações com relação ao discurso do prefeito
Valmir Climaco, na Câmara Municipal, a respeito da grande evasão de
divisas que está causando enorme prejuízo ao erário municipal.
“O ponto principal da fala do Prefeito,
no que ele tem total razão, foi quando ele expressou os fatos, e contra
fatos não há argumentos, sobre o não recolhimento de tributos. Ele foi
até modesto, porque, de fato, essa conta é um pouco mais de R$ 7
milhões. Na minha conta ela passa disso e chega a quase a R$ 9 milhões
de sonegação. O Município deixou de arrecadar bastante, e isso prejudica
os cofres da Prefeitura, o que consequentemente prejudica a população,
pois afeta de forma direta toda a economia de Itaituba. Tem como tributo
1% que é o IOF, e a CFEM de 0,2%, Em 2017 produziu-se mais do que em
2016, então, na conta do Prefeito, ele não chegou a números exatos, ou
seja, se ele separar o que recolheu o garimpo em 2016 e comparar com o
que recolheu o garimpo em 2017, essa conta chegaria próximo de R$ 9
milhões. Eu já fiz a conta. De R$ 7 milhões, o número de Valmir e R$ 9
milhões, que é a projeção é uma diferença significativa para a economia
do Município. Quando ele fala que, de fato, tem meia dúzia de
compradores de ouro que sonegam, é porque existe uma nova modalidade que
se está aplicando aqui, hoje, pois não é só em Itaituba, é no Brasil
todo, que é chamada compra para comercial exportadora. O ouro produzido
por garimpo, na lei, o que está escrito é que é legal ser adquirido pela
primeira aquisição por uma instituição financeira autorizada pelo Banco
Central do Brasil. Vamos lembrar que só quem comprava o ouro era a
Caixa Econômica ou o Banco do Brasil, ou o próprio Banco Central. Na
década de 80 transformou-se o ouro em ativo financeiro, e também se
permite a compra por instituições autorizadas pelo Banco Central. A
grande maioria das compradoras de ouro que hoje estão em Itaituba, e
vamos separar bem a questão, pois existem aquelas que são comerciais
exportadoras, existem aqueles compradores que não têm sequer empresa, e
esse é outro assunto grave, para comprar ouro com nota fiscal eletrônica
da Fazenda Estadual, onde não há nenhuma alíquota, nenhum imposto,
nenhum tributo. Ao fazer isso, esses compradores mandam esse ouro para
uma exportadora, uma trading, em São Paulo, ou em qualquer lugar, e de
lá eles exportam esse ouro, beneficiando-se da Lei Kandir, sem tem
recolhimento nenhum de tributo. Isso é do conhecimento da
Advocacia-Geral da União e do DNPM e essa situação está prejudicando
diretamente o Município. Muitas pessoas falam: “o garimpeiro não deve
pagar imposto”. O imposto do ouro é menor que tem no Brasil. Sabemos que
o garimpo é a principal mola econômica da nossa região, mas, nós temos
de entender que em uma sociedade, todos têm de dar sua contribuição”,
declarou Dirceu Frederico.
De acordo com sua experiência,
com os levantamentos que você fez, qual poderia ser a arrecadação
municipal de IOF e de CFEM, supondo-se que todo o ouro que circula no
Município fosse tributado?, perguntou a reportagem:
“Lembro que em 2017 produziu-se mais
ouro do que o ano de 2016. Entretanto, a compra ilegal foi 65% abaixo da
legal, em relação a 2016. Se todo o ouro produzido no nosso Município
saísse de forma legal, nós arrecadaríamos uma ordem de R$ 12 milhões por
ano, a uma média de R$ 1 milhão por mês. É claro que nos meses de
inverno isso não chegaria a R$ 1 milhão, mas nos meses do verão passaria
de R$ 1 milhão, e na média daria uma arrecadação da ordem de R$ 12
milhões, isso considerando as alíquotas que nós tínhamos até ano
passado; na atual alíquota, se todo o ouro produzido no município de
Itaituba fosse comercializado legalmente, esse número ultrapassaria R$
20 milhões de arrecadação. Nós temos os compradores que usam de um
artifício para agir de forma ilegal e temos aqueles que compram para
lavar dinheiro do crime”, alertou o empresário.
O advogado José Antunes, em entrevista
ao Jornal do Comércio e ao blog do Jota Parente, afirmou que a decisão
do presidente Michel Temer, de sancionar a Lei 13.540/2017, que
normatizou a Medida Provisória 789/2017 foi um tiro no pé…
“Totalmente correta a afirmação do
advogado José Antunes, que tem toda a bagagem de conhecimento, e sabe
exatamente o que está dizendo, porque o presidente Michel Temer, quando
mudou a alíquota aprovada pelo Congresso quando votou a medida
provisória, ele manteve o ouro de garimpo com 0,2%. O que acontece é que
alguns segmentos como do calcário, segmento de sal-gema e segmento de
fosfato, fizeram lobby para aproveitar e rebaixar suas alíquotas, e
colocaram mais cinco minerais na alíquota que era específica para
garimpo, para ouro e diamante produzido no garimpo, para pegar carona.
Isso prejudicou diretamente a economia e a legalidade do ouro. Isso só
beneficiou quem compra ouro na ilegalidade, pois, as empresas
autorizadas pelo Banco Central, que trabalham legalmente, não conseguem
comprar porque o sujeito paga R$ 2 ou R$ 3 a mais. Esses que sonegam
impostos e aqueles que lavam dinheiro para o tráfico, e aqui está tendo
muito, são um problema grave que está se alastrando no Brasil. Eles
conseguem pagar R$ 4 ou até R$ 5 mais caro que os compradores
legalizados. Até quando as empresas que compram ouro legalmente vão
aguentar sem fechar as portas?”, questionou.
Dirceu abordou, também, a
questão da refinaria de ouro que o governo do Estado tirou de Itaituba,
que causou comentários negativos em Itaituba, que é de onde irá a maior
parte do ouro para ser refinado…
“Eu fico muito à vontade para falar
sobre esse assunto, porque a primeira refinadora legalizada de ouro no
Estado do Pará foi a refinadora da D’Gold, aqui em Itaituba.
Infelizmente, por causa dos baixos volumes de compra, não conseguimos
mantê-la em atividade. Aquela refinadora fazia parte do projeto do São
José Liberto, na época, e foi inclusive inaugurada na época pela
primeira dama do Estado, Socorro Gabriel, e nós, durante um bom tempo
refinamos ouro. Com o advento das indústrias de mineração, digamos
assim, que é o caso da Serabi e do Tocantinzinho, que minas de ouro, eu
acho muito importante, muito relevante que o ouro seja refinado no nosso
Estado e que não saia do Brasil, exportado como ouro bruto. Essa é uma
das bandeiras que a gente defende na Anoro…”, disse Frederico.
De acordo com sua observação,
dada sua longa experiência nesse mercado, conhecendo as matrizes
econômicas do Município, quanto por cento dessa economia ainda depende
do ouro?, perguntamos.
“Falo nesses números há muitos anos. Na
verdade, quando eu estava mais presente em Itaituba, eu acompanhava mais
de perto. Sempre tive muita curiosidade de entender o que a gente chama
de fluxo ativo, que é aquilo que circula de capital, ou seja, o capital
circulante dentro do Município. Itaituba tem um capital circulante bem
interessante, e o que faz a diferença da gente para outros municípios
talvez do mesmo tamanho, na minha opinião, e não há nenhuma dúvida
quanto a isso, é o ouro. Eu lhe digo com certa precisão, que na década
de 80, quando eu cheguei aqui Itaituba, produzia-se entre 3 e 4
toneladas de ouro por mês. Itaituba passou por altos e baixos, mas,
depois do advento do uso de equipamentos como escavadeira hidráulica na
produção de ouro, nós tivemos uma alavancagem significativa da produção
na última década. Nesses últimos 10 anos, nós vemos a produção crescendo
e mantendo uma produção bastante interessante. Creio que na região do
Tapajós como um todo, se produz em torno de uma tonelada de ouro por
mês. Parte disso vem ser comercializada no município de Itaituba; outra
parte é comercializada no município de Jacareacanga, outra em Novo
Progresso e outra parte do ouro do Pará ainda sai para o Mato Grosso.
Levando-se em conta que o município de Itaituba, através da Prefeitura,
recebe, somando todas as suas fontes de arrecadação de impostos e
repasses da União, cerca de R$ 18 milhões a R$ 20 milhões por mês, o
ouro representa quatro vezes uma Prefeitura. Feita essa exposição,
constata-se que, caso o Município não tivesse essa economia baseada no
ouro, jamais teria a estrutura de comércio que tem. O ouro representa, e
eu tenho dito há bastante tempo, 70% da economia”, informou.
Ao ser questionado, se todo
mundo sabe desses problemas envolvendo o mercado do ouro, que você
abordou com muita propriedade no início desta reportagem, se todos os
entes governamentais sabem dos prejuízos que isso causa aos cofres
públicos, porque ninguém faz nada para combater esses crimes?, Dirceu
respondeu:
“Seu questionamento é absolutamente
pertinente. Eu lhe digo com toda sinceridade, que nós levantamos essas
questões na Anoro, no final do ano de 2016, e em 2017, somente sobre
este assunto, cobramos todos os órgãos em que nós estivemos presentes,
desde a Comissão de Valores Mobiliários, a Receita Federal, ao Coaf, ao
Banco Central, a Procuradoria Geral do DNPM, a secretaria de Minas e
Metalurgia, a Diretoria Geral do DNPM e ao Ministro das Minas e Energia.
Entre todas essas reuniões e audiências durante o ano de 2017, a Anoro,
representada por mim, e sempre por mais dois ou três membros da nossa
associação, 17 reuniões ao todo, com órgãos do governo, tudo
documentado, deixamos claro essa situação desagradável, porque ninguém
disse que é legal fazer o que é feito; todo mundo diz que é ilegal. A
gente não viu nenhum dos órgãos, ainda reagir. Os municípios estão
perdendo e a população está perdendo dinheiro com isso, enquanto algumas
pessoas estão colocando esse dinheiro no bolso, levando vantagem, em
detrimento do prejuízo de todos os outros. O que mais me chateia é
constatar que, efetivamente, os tentáculos do crime organizado estão
cada vez mais fortalecidos dentro desse segmento. Lamentavelmente, o
homem pode escolher aquilo que ele quer fazer. Eu escolhi o caminho da
legalidade. Os parceiros estão enfrentando grande dificuldade de
permanecer com as portas abertas por falta de providência das
autoridades. Eu não sei dizer se é prevaricação, ou o que está
acontecendo, porque eu falo e provo com documento, que em todas as
nossas audiências, nenhuma pessoa colocou que isso está certo; todos
dizem que está errado. Então, falta atacar o problema”, denunciou Dirceu
Frederico.
E como vai a atividade garimpeira na região?, perguntamos:
“O setor produtivo, o garimpeiro vai
bem. Nós estamos vendo que existem várias frentes de garimpo, várias
operações, e o volume de ouro sendo comercializado em nosso município é
bom. Basta ver o número de escavadeiras que são vendidas e negociadas
por ano, ou por mês no nosso Município; basta verificar a quantidade de
óleo diesel que é direcionado para a atividade garimpeira em Itaituba;
basta ver, nos últimos anos, quantos aviões a mais passaram a atuar
nesse setor. Os altos e baixos em função das chuvas são normais; a gente
convive com isso há muito tempo, mas, a produção está bem. O que nós
alertamos sempre, para que a gente permaneça bem, sobretudo, no nosso
Município, diz respeito às questões de ações por parte do governo, por
causa das questões ambientais, ações essas feitas pelo Ibama e ICMBio,
em virtude de garimpos não regulamentados. Devemos caminhar sempre rumo
em busca pela legitimidade e legalidade; nós não devemos nos esconder;
como garimpeiros, nós temos de ter orgulho de sermos o que nós somos,
mas, nós devemos também entender que toda condição estabelece uma
obrigação, e nós temos que buscar a legalização da atividade, desde a
produção até a venda”, alertou.
Existe quem reclame do governo
cobrar imposto do garimpeiro. Tem quem ache que garimpeiro deveria ser
isento. E não é pouco gente. Qual é sua opinião?
“Sobre esse ponto da incidência de
imposto na comercialização do ouro, as pessoas distorcem as informações,
e muitas vezes, até chegam acusando que a gente quer forçar o
garimpeiro a pagar tributo, ou coisa parecida. Na realidade, eu me sinto
muito tranquilo e à vontade, porque eu sei de toda minha história no
ramo do ouro e principalmente na defesa do garimpo. Essa não é uma
história de hoje, pois, eu tenho 31 anos de atividade no ramo do ouro.
Dediquei-me, sempre, ao município de Itaituba para buscar as melhores
condições para desenvolver a orientação educacional para desenvolver o
garimpo. Como Secretário de Mineração que fui, fiz o que esteve ao meu
alcance para facilitar a vida do garimpeiro. Hoje, a SEMMA está dando as
licenças ambientais, e aqui, quero registrar o reconhecimento de que o
atual governo municipal está concedendo as licenças, procurando agilizar
o trabalho, em vez de emperrar. Atualmente, como empresário do setor do
ouro, como presidente da Anoro e como dono de uma distribuidora de
valores, estou vendo que tudo aquilo que foi trabalhado e construído ao
longo do tempo é destruído por uma questão que não é justa, pois não é
justo que não se recolham tributos ao Município. Torno a dizer: esses
tributos sobre o ouro são muito baixos. Nós não devemos destruir o
caminho de legalidade, que é duramente construído, para a gente não ser
tratado como bandido. Hoje, o que eu vejo são bandidos aproveitando-se
da situação, travestindo-se de empresários, sem recolher absolutamente
nada. Esse pessoal usa dessa forma ilegal para lidar com o segmento de
compra de ouro, enquanto as empresas que são formalizadas estão
necessitando reduzir, ou até fechar suas portas, porque não têm saída.
Uma empresa que não fatura, você sabe, aguenta um tempo, tenta suportar
até onde dá, mas, chega uma hora que não dá para continuar. Esperamos e
confiamos que as autoridades, e quando digo as autoridades, faço menção
ao DNPM, à Receita Federal, ao Banco Central, à Polícia Federal e ao
Ministério Público, que se atentem ao que está acontecendo, porque o que
ocorre é uma ilegalidade que prejudica não só ao segmento do ouro, mas,
à sociedade de um modo geral. Triste é a gente estar vendo esse
movimento de comércio ilegal, de compra de ouro para lavagem de dinheiro
para o crime, sendo praticado dentro do nosso município, de forma
escancarada, aberta. E o resultado disso é que o segmento do comércio
legal de ouro, que sempre foi forte no nosso meio, tende a se
enfraquecer cada vez mais”, finalizou Dirceu Frederico Sobrinho.
Fonte: RG 15/O Impacto e Jota Parente.