É a primeira vez que a manifestação cultural recebe incentivo do Governo Federal.
Miguel Augusto, ministro Celso Sabino, Osmar Vieira, Ana Maria Pinho e Sebastião Campos comemoram apoio financeiro ao Çairé — Foto: Roberto Castro/ MTur
O ministro do Turismo Celso Sabino anunciou, nesta quarta-feira (21), a destinação de mais de R$ 3 milhões para o Çairé 2024, uma das festas mais tradicionais do Norte do Brasil, que neste ano ano será realizada de 19 e 23 de setembro no distrito de Alter do Chão, distante 37km da zona urbana de Santarém, no oeste do Pará.
É a primeira vez que a manifestação cultural recebe incentivo do Governo Federal. A iniciativa tem o apoio do Sistema Fecomércio do Pará.
“O apoio ajudará a gerar renda e oportunidades de emprego, atraindo mais turistas e, claro, preservando a identidade regional, garantindo que o Çairé continue encantando as futuras gerações”, afirmou o ministro do Turismo, Celso Sabino.
O ministro anunciou o apoio financeiro ao Sairé durante reunião em Brasília com a presidente do Boto Tucuxi, Ana Maria Pinho, o presidente do Boto Cor de Rosa Miguel Augusto e Osmar Vieira, juiz da festa.
"Só temos a agradecer esse apoio que estamos recebendo do Ministério. Estamos, aqui, de coração aberto para todos. Nos visitem! Vamos vivenciar a festa do Çairé, que só tende a melhorar”, comentou Miguel Augusto.
"É um momento histórico! Sou a primeira mulher presidente e já começamos com o pé direito. É o início de uma grande virada, não tenho dúvidas! Venham conhecer Alter do Chão", comemorou Ana Maria Pinho.
Durante o Sairé é realizado o Rito Religioso e também o Festival dos Botos, que é a parte profana da festa. Durante o festival, a lenda do boto ganha contornos de magia encantamento na disputa que é travada no Lago dos Botos entre os grupos folclóricos Tucuxi e Cor de Rosa.
O Çairé é realizado há mais de 300 anos em Alter do Chão. A festa movimenta cerca de 150 mil pessoas no distrito de Alter do Chão.
Incentivo ao turismo
Também presente na reunião, o presidente do Sistema Fecomércio do Pará, Sebastião Campos, ressaltou que a cultura potencializa o turismo, por isso, é preciso apoiar esses eventos. “Estamos fazendo história. Quero parabenizar ao ministério por essa iniciativa. Estamos, juntos, para incentivar que o Brasil tenha o melhor potencial turístico e a cultura ajuda muito a ampliar essa capacidade”, destacou.
O Ministério do Turismo informou que tem atuado para incentivar eventos turísticos que atraiam viajantes por todo o país. Foi o caso dos festejos juninos e do Festival de Parintins deste ano.
“Manifestações culturais, como essas, são um emblema de tudo que o nosso país tem a oferecer. São esses eventos que nos ajudam a divulgar o turismo do Brasil por todo o mundo”, finalizou o ministro Celso Sabino.
Do ritual religioso à disputa dos botos; conheça a história do Çairé
Pesquisadores acreditam que festa tem 300 anos na região oeste do Pará.
Não há certeza sobre local de origem, mas festa sobrevive em Alter do Chão.
Saraipora leva o símbolo do Çairé na parte religiosa da festa, em 2008 (Foto: Arquivo/Zé Rodrigues)
A festa do Çairé, realizada todos os anos no mês de setembro na vila de Alter do Chão, distrito de Santarém, no oeste do Pará, em 2014, tem programação prevista para 11 a 15 de setembro. Antes da abertura oficial, há o ritual da busca dos mastros realizado pelos moradores da vila. O evento é marcado pelo religioso e profano, com ladainhas e rituais que lembram os povos indígenas, além do Festival dos Botos, no qual é encenada a lenda regional.
Origem
Alguns pesquisadores acreditam que o evento tenha 300 anos. De acordo com o que a historiadora Terezinha Amorim escreveu em seu livro “Sairé: uma manifestação cultural do povo Borari”, o evento religioso era realizado pelos índios em vários lugares da Amazônia para homenagear os colonizadores portugueses.
O historiador padre Sidney Canto afirma na obra “Alter do Chão e Çairé: contribuição para a história”, que a manifestação foi uma espécie de intervenção dos missionários jesuítas para introduzir o cristianismo nos nativos da região.
Terezinha explica em seu livro que o ritual consistia numa procissão para conduzir o Çairé, objeto em forma de semicírculo produzido de cipó e coberto por algodão enfeitado com fitas e flores regionais. Após a procissão, era ainda feita reza e jantar com comidas típicas da Amazônia. Em seguida, havia queima de fogos.
Introdução da festa em Alter
Não há certeza sobre local de origem, mas festa sobrevive em Alter do Chão.
Saraipora leva o símbolo do Çairé na parte religiosa da festa, em 2008 (Foto: Arquivo/Zé Rodrigues)
A festa do Çairé, realizada todos os anos no mês de setembro na vila de Alter do Chão, distrito de Santarém, no oeste do Pará, em 2014, tem programação prevista para 11 a 15 de setembro. Antes da abertura oficial, há o ritual da busca dos mastros realizado pelos moradores da vila. O evento é marcado pelo religioso e profano, com ladainhas e rituais que lembram os povos indígenas, além do Festival dos Botos, no qual é encenada a lenda regional.
Origem
Alguns pesquisadores acreditam que o evento tenha 300 anos. De acordo com o que a historiadora Terezinha Amorim escreveu em seu livro “Sairé: uma manifestação cultural do povo Borari”, o evento religioso era realizado pelos índios em vários lugares da Amazônia para homenagear os colonizadores portugueses.
O historiador padre Sidney Canto afirma na obra “Alter do Chão e Çairé: contribuição para a história”, que a manifestação foi uma espécie de intervenção dos missionários jesuítas para introduzir o cristianismo nos nativos da região.
Terezinha explica em seu livro que o ritual consistia numa procissão para conduzir o Çairé, objeto em forma de semicírculo produzido de cipó e coberto por algodão enfeitado com fitas e flores regionais. Após a procissão, era ainda feita reza e jantar com comidas típicas da Amazônia. Em seguida, havia queima de fogos.
Introdução da festa em Alter
Segundo os historiadores, a introdução do Çairé em Santarém e Alter do Chão foi feita pelo padre jesuíta italiano João Maria Gorzoni, no século XVII, ensinando os índios a fabricar e tocar instrumentos musicais.
De acordo com a pesquisa do padre Sidney Canto, os dois relatos mais antigos do Sairé em Alter do Chão são de 1951, feita por Nunes Pinto, e outro no início dos anos 1980, feito pelos professores João de Jesus Paes Loureiro e Violeta Refkalefsky Loureiro, citando a senhora Nice Lobato Gonçalves com algumas pequenas divergências entre ambos os relatos. Segundo Canto, de acordo com os registros históricos na região do Baixo Amazonas conseguidos por ele, o Çairé mais antigo era realizado em Vila Franca. Ele é enfático em afirmar que não encontrou nenhum documento que afirmasse o nascimento da festa em Alter do Chão, mas que o Çairé desapareceu dos demais lugares em que existia antigamente.
Definições e personagens
Para o padre Sidney Canto, autor da mais recente obra sobre a questão, a palavra Sairé é definida pelo símbolo ou armação feita de madeira ou cipó; pela procissão feita com o símbolo conduzido por uma mulher acompanhada de tambores e cânticos para saudar as autoridades; e pela festa realizada após a procissão.
Proibição e resgate
O padre esclarece que na década de 1940 o Sairé foi proibido porque havia abusos nos rituais sem consentimento das autoridades religiosas, com a inserção de jogos e vendas de bebidas alcoólicas que quase sempre provocavam brigas e mortes. Além disso, havia exploração econômica em nome da religião.
Depois de 30 anos de proibição, os moradores da vila resolveram resgatar o Sairé como manifestação folclórica em 1973 desvinculada à Igreja Católica, sendo celebrada junto com a festa de Nossa Senhora da Saúde, padroeira da vila. Segundo Sidney Canto, o Sairé passou a ser realizado fora do contexto histórico e cultural a qual inicialmente foi proposto: a catequese.
Festival dos Botos
Em 1997, foi introduzido o Festival dos Botos, disputa entre as associações folclóricas Tucuxi e Cor de Rosa, na qual encenam a lenda do golfinho de água doce que se transforma num homem bonito, seduz e engravida as mulheres.
Segundo Canto, o Festival dos Botos foi copiado do Festival dos Bois de Parintins (AM), causando também a mudança de local de realização do Sairé, saindo da ramada montada ao lado da Igreja de Nossa Senhora da Saúde para ser realizado no Sairódromo, abolindo assim várias danças folclóricas, sendo introduzidos shows de músicos de renome nacional.
Botos Cor de Rosa e Tucuxi disputam a melhor encenação da lenda (Foto: Arquivo/Zé Rodrigues)
Para a historiadora Terezinha Amorim, a introdução do Festival dos Botos foi a maior de todas as inovações ocorridas ao longo de mais de 300 anos de existência do Sairé, sendo a encenação de “uma das mais belas e mais tradicionais lendas da Amazônia”.
No Lago Verde, a encenação gira em torno da sedução, morte e ressurreição do boto, tendo como personagens a Cunhantã-iborari, a Principaleza do Lago Verde, a Rainha do Sairé, o Tuxaua, o Pajé e os pescadores. O boto é morto por ordem do pai (tuxaua) da moça (Cunhã-borari) seduzida e engravidada pelo boto. A fúria dos maus espíritos da região recaem sobre Tuxaua que pede ao Pajé que ressuscite o boto.
Terezinha acredita que, mesmo com a perda da originalidade do Sairé com a introdução dos elementos profanos, as inovações deram mais empolgação e estimularam mais a visita de pessoas a Alter do Chão.
Sedução Boto Tucuxi na festa de 2008
(Foto: Arquivo/Zé Rodrigues)
Para a antropóloga da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Luciana Carvalho, que participou de um estudo conduzido pela universidade em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para tentar resgatar as origens do Sairé, todas as manifestações culturais passam por sucessivas transformações ao longo do tempo, embora sejam mantidas algumas tradições e outras vão sendo adaptadas. “As pessoas tendem a dividir como profano e religioso, mas acho que não tem muito sentido. Na verdade, tudo isso é a festa. Hoje, o que é religioso era considerado profano há 40 anos atrás”, acredita.
Polêmica grafia com ‘s’ ou ‘ç’
(Foto: Arquivo/Zé Rodrigues)
Para a antropóloga da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), Luciana Carvalho, que participou de um estudo conduzido pela universidade em parceria com o Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) para tentar resgatar as origens do Sairé, todas as manifestações culturais passam por sucessivas transformações ao longo do tempo, embora sejam mantidas algumas tradições e outras vão sendo adaptadas. “As pessoas tendem a dividir como profano e religioso, mas acho que não tem muito sentido. Na verdade, tudo isso é a festa. Hoje, o que é religioso era considerado profano há 40 anos atrás”, acredita.
Polêmica grafia com ‘s’ ou ‘ç’
A forma de se escrever o nome da festa é polêmica, uma vez que há quem defenda o ‘s’ inicial ou o ‘ç’ para iniciar a palavra, apesar de esta segunda opção não fazer parte da maneira formal da língua portuguesa. Em 1997, a grafia com ‘ç’ foi introduzida na palavra, mas retirada em 2004, tendo retornado em 2013.
Sedução Boto Cor de Rosa na festa de 2008
(Foto: Zé Rodrigues/TV Tapajós)
(Foto: Zé Rodrigues/TV Tapajós)