
Desenvolvido pela professora Kariane
Nunes, da Universidade Federal do Oeste do Pará (Ufopa), o batom usa
como insumo o caroço do bacuri, que costuma ser descartado pela
indústria alimentícia. “A principal matéria-prima dos batons é a cera de
carnaúba, que dá a dureza, e a cera de abelha, que dá emoliência. Mas a
cera de abelha, além de não ser típica da Amazônia, é muito cara. Então
substituímos pela manteiga de bacuri, que apresenta alto valor do ácido
graxo palmitoléico: 5% em comparação com outros óleos que não possuem
mais que 1,5%, qualificando a manteiga do bacuri como um emoliente
fantástico. E ela também pode ser usada como umectante”, explica a
pesquisadora.
Além de agregar valor comercial ao
produto, a manteiga de bacuri também proporcionou maior funcionalidade.
“Conseguimos provar que nossos batons são muito mais hidratantes que os
produzidos com cera de abelha”, ressalta Kariane.
Mesmo mais emoliente, o batom continuava
sendo produzido com pigmentos sintéticos, que contém alto teor de
cádmio e chumbo, metais pesados e tóxicos, que representam um grande
gargalo para a indústria cosmética em geral. “São esses componentes que
proporcionam cores aos batom e permitem uma fixação prolongada nos
lábios. Quanto mais cor, mais metal pesado e, portanto, mais tóxico o
batom”, detalha Kariane.
Partindo da intenção de tornar o batom
amazônico o mais natural possível, Kariane começou a pensar na linha dos
biocosméticos ou cosméticos verdes. Em parceria com o professor
Leopoldo Barato, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ),
consideraram a possibilidade de trabalhar com pigmentos naturais. Foi
quando surgiu a ideia do jambo-vermelho, muito frequente em quintais e
ruas de Santarém.
Em 2015, iniciaram o experimento no
âmbito do Laboratório de Farmacotécnica, vinculado ao Instituto de Saúde
Coletiva (Isco) da Ufopa. Depois de passarem um mês coletando jambos
pela cidade, Leopoldo, especialista na área de fitoquímica, passou a
lidar com a parte do extrato, elaborado a partir das cascas da fruta.
Kariane trabalhou diretamente com o desenvolvimento da formulação, já
que sua especialidade é a área de tecnologia farmacêutica.
Da planta ao cosmético – Quem
explica o processo é Bruna Cantal de Souza, aluna do 8º semestre de
Farmácia na Ufopa e bolsista do Programa Institucional de Bolsas de
Iniciação Científica e de Desenvolvimento Tecnológico e Inovação
(Pibiti/Ufopa). “Os frutos foram separados por tempo de maturação, para
termos uma cor bem homogênea. Depois descascamos e secamos as cascas por
uma semana. É necessário ter cuidado com a temperatura de secagem,
porque os pigmentos contidos nas cascas podem oxidar”, relata.
O passo seguinte é moer e deixar as
cascas em percolação, que consiste em deixá-las afundadas em álcool para
ir retirando o extrato, esgotando as cascas aos poucos. Depois é
preciso retirar o álcool através do processo chamado rotaevaporação. “Aí
resta só o pigmento puro para aplicar na formulação”, diz a estudante.
Outra inovação da pesquisa foi a
substituição do dióxido de titânio presente na fórmula por goma de
tapioca. O dióxido funciona como uma espécie de protetor solar, deixando
a formulação mais clara e permitindo controlar a tonalidade do
pigmento. “Só que ele também é tóxico. Então substituímos por um produto
natural, da nossa região, que tem a mesma cor e textura”, ressalta
Bruna. Nas composições tradicionais, o dióxido de titânio também
funciona como antioxidante. “Mas a molécula do nosso pigmento orgânico é
uma antocianina, que já é antioxidante”, explica.
A intenção da equipe de pesquisa é
retirar da formulação a maior quantidade possível de elementos tóxicos,
como, por exemplo, o EDTA ácido, um estabilizante que funciona como
conservante, prolongando a validade da fórmula. “Esse é o único
componente tóxico que ainda resta em nossa composição. Mas já estamos
pesquisando uma substância de origem natural para usar no lugar”,
adianta a jovem.
Apesar dos entraves, as pesquisadoras
acreditam que é cada vez maior o público que demanda do mercado
cosméticos naturais, livres de químicas nocivas à saúde. “É melhor
garantirmos o uso racional e seguro desses cosméticos, mesmo que seja
necessário o retoque do batom por três ou quatro vezes ao dia, ao invés
de colocarmos em cheque a nossa saúde”, categoriza Kariane.
Fonte: RG 15/O Impacto e Renata Dantas/Ufopa