A reforma eleitoral, aprovada no Congresso Nacional e sancionada recentemente pelo presidente Michel Temer, traz mudanças importantes nas campanhas realizadas nos meios de comunicação. Uma delas é a liberação parcial de propaganda paga na internet. O tema levanta reflexões de especialistas na área de tecnologia e comunicação.
Conforme a reforma, é “vedada a
veiculação de qualquer propaganda paga na internet, excetuado o
impulsionamento de conteúdos”. Essa alternativa é permitida apenas
quando o autor for identificado e se o serviço for contratado por
partidos, coligações, candidatos e representantes. O uso deste recurso,
contudo, não pode ser feito em dia de votação.
Ainda de acordo com o texto, é proibido
usar ferramentas que não aquelas disponibilizadas pelo provedor “para
alterar o teor ou a repercussão de propaganda eleitoral, tanto próprios
quanto de terceiros”.
O provedor deve manter canal de
comunicação com os usuários e pode ser responsabilizado por danos
causados pela publicação impulsionada se houver decisão judicial pela
retirada e ela não for cumprida.
Essa novidade amplia os instrumentos de
divulgação para as campanhas em relação aos existentes hoje. Pela
legislação atual, um candidato pode manter um site, desde que com
endereço eletrônico informado à Justiça Eleitoral e hospedado em
provedor estabelecido no Brasil. Também é permitido o envio de mensagens
eletrônicas, como e-mails ou mensagens no Whatsapp, além de publicações nas redes sociais.
Redes Sociais e eleições
Segundo a pesquisa TIC Domicílios,
do Comitê Gestor da Internet, 58% dos brasileiros estão conectados à
internet. De acordo com a Pesquisa Brasileira de Mídia 2016, realizada
pelo Ibope a pedido do governo federal, metade dos pesquisados afirmou
se informar pela internet. O meio é o segundo mais popular para a busca
de notícias, ficando atrás apenas da TV, mencionada por 89% dos
entrevistados. A principal rede social usada pelos brasileiros, o
Whatsapp, informou em maio deste ano ter cerca de 120 milhões de
usuários no Brasil.
Para o professor da Universidade Federal
do Espírito Santo (Ufes) e coordenador do Laboratório de Estudos sobre
Imagem e Cibercultura (Labic), Fábio Malini, as redes sociais vêm sendo
elemento relevante nas eleições em diversos países (como Espanha, Reino
Unido e Estados Unidos) e não será diferente no Brasil em 2018. Com a
possibilidade de impulsionamento de conteúdo aberta pela reforma
eleitoral, os candidatos poderão manter estratégias de propaganda mais
sofisticadas.
“O papel mais central das redes sociais
será a direção exata da propaganda política que não se tinha antes.
Mesmo com ambiente digital, se partia do pressuposto de que o usuário
tinha que ir até a página, fazer a busca. Pela primeira vez vai se poder
trabalhar uma propaganda para um território, faixa etária, profissão.
Essa experiência de ir no foco publicitário é algo que a gente vai ter
de forma forte nas próximas eleições”, destaca Malini.
Riscos
Na avaliação do professor da Universidade
Federal do ABC, Sérgio Amadeu, a medida é problemática porque beneficia
candidaturas com mais recursos. Para além do impulsionamento implicar
gastos, estes vão se tornar cada vez maiores, aumentando o obstáculo
financeiro dos candidatos com menos estrutura. Isso porque o
impulsionamento se dá pela forma de “leilão”. Ou seja, o preço para
conseguir ampliar o alcance de um “post” aumenta conforme a demanda. Em
uma eleição, com diversos candidatos tendo apenas o Facebook como canal
pago na internet, a tendência é que esse custo seja cada vez maior.
“A postagem de um candidato com menos
dinheiro vai atingir menos de 1% dos seus seguidores, enquanto
candidatos com muito dinheiro e que já aplicam no Facebook vão poder
fazer uma campanha de maior alcance, o que dará uma visão distorcida”,
argumenta o professor, que também é membro do Comitê Gestor da Internet
no Brasil (CGI-Br).
“Muitos eleitores terão a falsa impressão
de que aquele candidato é relevante, popular e bem visto quando
comparado a outros invisíveis, quando na verdade ele só aparece em sua
“timeline” porque pagou para que isso acontecesse e grande parte das
suas interações positivas podem ser falsas, produzidas por “chatbots”,
isto é, perfis artificiais que simulam conversas e interação”,
acrescenta Sivaldo Pereira da Silva, professor da Universidade de
Brasília e coordenador do Centro de Estudos em Comunicação, Tecnologia e
Política (CTPol).
Para Renata Mielli, jornalista e
coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, a
abertura de propaganda privilegia os anúncios em somente uma plataforma,
o Facebook, e impede que candidatos optem por outros sites ou canais na
internet. “Criar distinção entre esses espaços não é compatível com uma
postura mais equilibrada e democrática dentro das regras do jogo
eleitoral”, defende.
Mielli acrescenta que há o problema da
falta de transparência na disseminação dos conteúdos publicados. “O
Facebook seleciona o que as pessoas visualizam na ‘timeline’ por meio de
algoritmos e isso não é transparente. Isso pode gerar uma
invisibilidade de candidatos com menos recursos enquanto outro serão
privilegiados”, alerta.
Facebook
A Agência Brasil entrou
em contato com o escritório do Facebook no Brasil. Mas a empresa
informou que não dispunha de uma posição oficial sobre a reforma
eleitoral.
Fonte: Agência Brasil