As
partículas carregadas de toxinas, liberadas durante queimadas na
Amazônia, se inaladas involuntariamente por longo período, podem causar
estresse oxidativo das células e danos genéticos irreversíveis,
resultando até mesmo em câncer de pulmão.
A descoberta é resultado de um estudo
realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP),
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Fundação Oswaldo
Cruz e Universidade Federal de Rondônia(Ufro). A pesquisa é referente a
uma tese de doutorado da bióloga Nilmara de Oliveira Alves, da USP. A
equipe coletou amostras de material particulado fino em Porto Velho, uma
das áreas mais afetadas pelas queimadas na região amazônica.
Para entender como ocorre a contaminação,
os pesquisadores expuseram em laboratório linhagem de células
pulmonares às partículas, compostas por material tóxico, em concentração
semelhante com as encontradas nas queimadas da Amazônia, analisadas com
técnicas bioquímicas avançadas. Essas análises permitiram medir o grau
de inflamação e de lesão no DNA. Foi comprovado que o dano no DNA pode
ser tão grave a ponto de a célula perder o controle e começar a se
reproduzir desordenadamente, evoluindo para câncer de pulmão.
Para a pesquisadora Sandra Hacon, da
Escola Nacional de Saúde Pública, as conclusões do trabalho são
inéditas. Segundo ela, pela primeira vez foi possível demonstrar que as
partículas de queimadas da Amazônia, ao entrarem nos alvéolos
pulmonares, causam danos genéticos nas células, podendo leva ao câncer
de pulmão. Sandra Hacon e o pesquisador Christovam Barcellos coordenaram
o projeto Clima & Saúde da sub Rede de Mudanças Climáticas do
INPE/INCT Rede Clima.
O estudo foi publicado na revista Nature
Scientific Reports. O projeto da Rede Clima envolve os efeitos das
queimadas com alterações climáticas. Sandra informou que algumas medidas
podem ser adotadas pelas autoridades ambientais e de saúde, no sentido
de evitar o agravamento de doenças respiratórias na população, exposta a
fumaça das queimadas.
“É uma questão de bom senso. Não faz
sentido continuar esse processo de queimadas na Amazônia. A situação
estava controlada, mas houve aumento acentuado nos últimos três anos.
Uma alternativa é a montagem, pelas secretarias municipais de Saúde, de
um sistema de vigilância das doenças respiratórias, de modo a ajudar a
população das cidades onde as queimadas vem ocorrendo de forma
sistemática”.
Nos meses de agosto, setembro e outubro
os focos de incêndios dissipam uma nuvem de fumaça tóxica sobre a região
amazônica. A população mais vulnerável é formada por crianças e idosos.
De acordo com Sandra Hancon, as crianças menores de cinco anos,
prejudicadas pelo impacto das partículas com componentes cancerígenos da
fumaça das queimadas, desenvolvem alergias respiratórias, que
comprometem o aprendizado escolar. Conforme a pesquisadora, os mais
atingidos são principalmente famílias de baixa renda, que estão em áreas
de risco sem alternativa de sair.
Sandra Hacon disse ainda que a divulgação
do trabalho pode incentivar as autoridades a instituir na região um
programa de melhoria da qualidade do ar e monitoramento dessas
partículas finas provenientes das queimadas, decorrentes da ocupação
desordenada para atender a interesses econômicos.
Dados do Programa Queimadas, do Instituto
Nacional de Pesquisas Espaciais, indicam que em 2017 ocorreram mais de
275 mil focos de incêndio em todo o território nacional, sendo mais de
132 mil em estados amazônicos.
Fonte: UFRO