Por Luiz Flávio Gomes ( * )
Em 1989, com a derrubada do muro de Berlim (que
significou o fim do regime comunista em muitos países), Francis Fukuyama
declarou a vitória do liberalismo econômico e político, ou seja, o
triunfo do Ocidente. Naquele mesmo ano o PIB chinês representava apenas
8% do norte-americano; em 2016 passará a ser de, no mínimo, 60%. Em
1978, o rendimento anual do norte-americano era vinte vezes maior que o
chinês; hoje, apenas cinco vezes.
“Não importa a cor do gato, desde que ele cace o
rato”: com essa frase o líder chinês Deng Xiaoping justificava os
benefícios da abertura econômica da China na década de 70, a despeito
dos princípios do comunismo. Daí para cá, enquanto a China (e o Oriente)
cresce, o Ocidente está estagnado. O que está ocorrendo com o Ocidente?
Um mal-estar institucional (Ferguson: 2013, p.
53), que está violando o verdadeiro contrato social, que é
intergeracional (conforme Edmund Burke), ao deixar uma pesada carga de
compromissos econômicos aos filhos e netos da atual geração. Os jovens
das classes inferiorizadas, hoje, têm a sensação de que as classes
dominantes estão arrebatando o seu presente (consumista) assim como o
seu futuro (Ferguson: 2013, p. 61).
De que maneira? Basta passar os olhos nos
“capitais” que definem as classes sociais. São eles, dentre outros: o
econômico (dinheiro, patrimônio, ações, ganhos de capital, juros), o
cultural (conhecimento adquirido), o social (relações sociais,
prestígio, respeito social, privilégios), o emocional (autocontrole,
prudência, perspectiva de futuro, visão prospectiva etc.), o moral/ético
(perfeita noção de que devemos respeitar as demais pessoas, a natureza,
os animais e o bom uso das tecnologias) e o familiar (família bem
articulada, que transmite muita informação útil para o processo de
socialização das crianças e adolescentes) etc. (veja Jessé Souza,Os batalhadores).
Vendo diariamente os desmandos concentradores
praticados pelo capitalismo atrasado vigente no Brasil assim como o
descalabro do Estado estacionário brasileiro, com suas instituições
políticas, econômicas, jurídicas e sociais degeneradas, as classes
dominadas (C e D) estão cada vez mais conscientes das suas condições
precárias no mercado de trabalho, nos estudos e nos relacionamentos
sociais, o que compromete o seu presente consumista assim como o seu
futuro.
Tudo isso seria compensado com serviços públicos
de qualidade, como saúde, educação e transportes. Mas esse
definitivamente não é o caso do Brasil injusto e estacionário.
Resultado: frustração, desesperança, ódio, sensação de impotência e
indignação, que são os ingredientes necessários para desmoronar qualquer
país decadente e socialmente retrocessivo, sobretudo depois da
democratização do acesso às redes sociais.
( * ) – Luiz Flávio Gomes é jurista e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.