Familiares de pacientes denunciam que precisam comprar medicamentos com recursos próprios
“[…] não adianta consultarmos os
pacientes, e não termos os remédios básicos, para atendê-los, sob o
risco de perdermos vidas, pela ausência de medicamentos e insumos, para
pronto atendimento […]”, desta forma, os médicos que atuam na Unidade
Pronto Atendimento 24 horas, em Santarém, denunciaram, o que eles chamam
‘negligência’, sobre a falta de medicamentos naquela unidade de saúde.
O momento dramático enfrentado pela
saúde pública no Município tem revelado o lado sombrio do descaso com a
vida. Familiares de pacientes denunciam que precisam comprar
medicamentos com recursos próprios, pois até mesmo medicamentos básicos
não estão disponíveis.
Esgotadas todas as vias possíveis de
solicitação oficial, os médicos da UPA 24 horas, localizada na Avenida
Curuá-Una, bairro do Diamantino, não tiveram outra alternativa ao não
ser informar, por meio de documento, a dramática falta de medicamentos
ao Conselho Municipal de Saúde (CMS) e ao Ministério Público Estadual
(MPE). O mesmo documento foi encaminhado para o prefeito Alexandre Von e
para o Secretário Municipal de Saúde, Valter Sinimbú.
Em parte do texto, os médicos se propõem
a levar ao conhecimento dos signatários, a situação de abandono e de
risco à vida dos usuários do sistema de saúde pública. “Os serviços
prestados por esta supracitada (UPA 24 horas) possui recursos humanos em
quantidade insuficiente (tanto profissional médico, enfermeiro, técnico
de enfermagem), muitas das vezes não conseguindo realizar um
atendimento adequado, não suprindo a necessidade da demanda apresentada,
necessitando assim de pelo menos mais um profissional médico, para sala
vermelha”, informam.
INSPEÇÃO: O documento
foi protocolado no CMS no dia 14 de outubro. Logo em seguida, a entidade
fez uma visita in loco na UPA 24 horas, onde foi confirmada a denúncia
dos médicos. De acordo com a Conselheira Gracivane Moura, dos vinte e
cinco medicamentos listados pelos profissionais de saúde, foram
constatados que na farmácia da unidade de saúde, existiam apenas sete
medicamentos. O que representava uma quantidade insuficiente para
atender a demanda de um final de semana, por exemplo.
CRISE FINANCEIRA: Em
nota divulgada à imprensa, a Prefeitura de Santarém informou que a falta
de medicamento é resultado da diminuição drástica dos recursos
repassados pelos Governos Federal e Estadual para a área da saúde. E que
tem feito o possível para manter os estoques, inclusive utilizando de
recursos próprios para comprar os remédios.
Porém, o CMS informou que acompanha o
repasse de recursos do governo federal, realizado para Prefeitura de
Santarém, e que os montantes referentes aos subsídios da UPA 24 horas
(no mês de outubro recebeu 650 mil reais) e do Hospital Municipal (no
mês de outubro recebeu mais de 2,2 milhões de reais) estão em dia.
MPE EM AÇÃO: Tão logo
recebeu o documento elaborado pelos médicos da UPA 24 horas, a Promotora
de Justiça Lilian Regina Furtado Braga, titular da 8ª Promotoria de
Justiça (Saúde e Educação), iniciou os trabalhos de verificações das
informações. De acordo com a Promotora, tanto o Prefeito Alexandre Von,
como o Secretário Municipal de Saúde Valter Sinimbú estão cientes da
problemática.
“Após receber a informação imediatamente
fizemos contato com o Conselho Municipal e com a coordenadora da UPA,
de modo a verificar se a informação era verídica e pertinente, e se
estaria faltando mais algum insumo necessário. De posse dessas
informações nós oficiamos a Prefeitura e estamos aguardando as
informações. Demos um prazo para que a Prefeitura se manifestasse”,
informou a promotora Lilian Braga.
Em seu trabalho junto às problemáticas
da área de saúde, ela tem observado sistematicamente, que a cada fim de
ano aumenta a dificuldade de atendimento no Município, e diz que o
cenário deste ano é muito igual ao que ocorreu no ano passado, onde
foram registradas várias denúncias.
Para a Promotora, alguns fatores acabam
contribuindo em demasia para o atual quadro de precarização do
atendimento da saúde pública em Santarém. E um dos principais, é a
grande concentração de pacientes de outros municípios para receberem
atendimento na Pérola do Tapajós.
“Isso agrava o quadro porque avoluma o
número de pessoas a serem atendidas. Porque o número de pacientes que
deveriam vir para Santarém são aqueles casos de média e alta
complexidade, que teriam como porta o Hospital Municipal – para seguir
para o Regional -, de modo a ter o atendimento especializado, que em
tese, ele não teria no seu Município. Mas o que a gente observa é que
alguns municípios não cumprem o seu papel no atendimento de saúde básica
e tem encaminhado para Santarém pacientes que deveriam ser atendidos no
próprio município. Isso sobrecarrega o serviço de saúde em Santarém.
Atualmente, no Hospital Municipal 60% ou mais pacientes são de outros
municípios. Santarém recebe pacientes de Almeirim a Jacareacanga,
incluído a Calha Norte e a Bacia do Tapajós. Estamos atualmente
procurando medidas para solucionar isso. Temos municípios que possuem
centros cirúrgicos preparados, mas não realizam cirurgias. Todos esses
problemas já foram identificados e estamos em diálogo com os secretários
de saúde desses municípios para viabilizar soluções”, explica a
Promotora Pública.
Sobre o exponencial aumento das demandas
que chegam ao MPE, que estão relacionados os descasos na saúde, ela
acrescenta. “Considero alguns fatores. O primeiro é que cada vez mais a
população se dá conta do seu exercício de cidadania, e procura o
Ministério Público, que tem como uma de suas atividades atender os
direitos da coletividade e fazer a interlocução desses direitos com o
poder público. Segundo, temos notado que algumas demandas que antes eram
resolvidas diretamente entre o cidadão e a Secretaria de Saúde, tem
sido retardados, demorados e até mesmo, algumas vezes, negados. Há casos
em que a pessoa já procurou várias vezes a Secretaria e não obteve
retorno, e acaba vendo no Ministério Público uma forma de ver sua
demanda atendida. Percebemos ainda que esse processo de precarização vem
se agravando, de acordo com as informações do Estado e do Município,
pela diminuição dos recursos para os serviços de saúde, seja para a
compra de medicamentos, seja para insumos de um modo em geral. O TFD,
por exemplo, é um desses problemas sérios, que é objeto de várias ações
judiciais ajuizadas pelo MP”, expõem.
Como exemplo da atuação do Ministério
Público Estadual (MPE) para tentar melhorar o atendimento dos santarenos
que precisam do SUS, Lilian Braga cita as Ações Civis Públicas
ajuizadas contra o Estado.
“Em relação ao Governo Estadual, temos
inclusive uma Ação Civil Pública ajuizada em dezembro de 2015, que teve o
pedido deferido em janeiro de 2016 para o pagamento dos repasses
atrasados do Estado. Atualmente, estamos aguardando as informações
atualizadas da prefeitura para saber se os valores estão em dia”. Outra
demanda foi sobre o serviço de hemodiálise, “Em maio de 2015 o
Ministério Público de Santarém ajuizou Ação Civil Pública contra o
Estado do Pará, para a construção de um Centro de Nefrologia no
Município. A ação está em andamento. A nefrologia é um serviço complexo
que deve ser assumido pelo Estado, e não pelo município”, cita Lilian
Braga.
DOENTES RENAIS CRÔNICOS COBRAM CONSTRUÇÃO DO CENTRO DE NEFROLOGIA EM SANTARÉM: De
acordo com a denúncia realizada pelo presidente da Associação dos
Doentes Renais Crônicos do Oeste do Pará (ARCOP), Miguel da Conceição
Maciel, a cada mês que passa aumenta a demanda de paciente que precisam
realizar hemodiálise em Santarém. Porém, os pacientes estão passando por
muitas dificuldades para serem atendidos. “Mesmo com a Ação Civil
Pública (ACP) impetrada pelo Ministério Público Estadual (MPE) contra o
Estado do Pará, a única providência efetivada foi à implantação do
quarto turno de homodiálise no Hospital Regional do Baixo Amazonas
(HRBA), fato este que não conseguiu amenizar a situação dos que precisam
urgentemente do tratamento, uma vez que a demanda no último ano
aumentou bastante. Hoje no Hospital Municipal, existem pacientes
internados, ocupando leitos que poderiam servir para outros doentes.
Essas pessoas precisam de hemodiálise em local adequado, que seria o
Centro de Nefrologia de Santarém, que também foi solicitado na ACP, mas
que até o momento nãos temos uma resposta concreta. Então, solicitamos
às autoridades que nos deem um retorno, pois são pessoas que estão
precisando de atendimento, e correm risco de morte”, afirmou Miguel.
Segundo o presidente da ARCOP, o serviço
de hemodiálise é de responsabilidade do Estado. Tanto o Hospital
Regional, quanto o Hospital Municipal oferecem o serviço, por meio de um
termo de cooperação técnica entre estado e município. O HRBA dispõe de
30 máquinas de hemodiálise, sendo 27 em funcionamento e outras três como
reservas. E o Hospital Municipal conta com 10 equipamentos. Os
equipamentos das duas instituições juntas estão com dificuldades de
atender a demanda.
No mês de maio do ano passado, o MPE de
Santarém ajuizou ação civil pública contra o Estado do Pará, para a
construção de um centro de Nefrologia no município, e para a implantação
do quarto turno do serviço de hemodiálise no hospital regional do Baixo
Amazonas. A ACP foi ajuizada pela 8ª promotoria de justiça de Direitos
Constitucionais – Educação e Saúde. O município de Santarém é polo de
atendimento para os municípios do oeste do Pará e desde 2012 o MPE atua
na tentativa de melhorar o serviço, em conjunto com a Associação dos
Doentes Renais Crônicos do Oeste do Pará (ARCOP).
CENTRO DE NEFROLOGIA:
Na época, o turno extra seria a solução de curto prazo, considerando que
a Organização Mundial de Saúde prevê o aumento em 10%, a cada ano, do
número de pacientes renais crônicos. Então, a solução seria a criação de
um Centro de Nefrologia, que são unidades certificadas como Hospitais
de Ensino, que oferecem todos os atendimentos necessários aos portadores
de doença renal, incluindo ambulatório, internação e todas as
modalidades de diálise.
A ACP requereu a determinação de liminar
para que fosse iniciado, imediatamente, o 4º turno do serviço de
hemodiálise no Hospital Regional. Em caso de concessão da liminar,
requeria aplicação de multa por descumprimento, a ser revertida em
políticas públicas voltadas para o atendimento de pacientes renais
crônicos.
E que no prazo de quatro meses, o Estado
apresentasse planejamento técnico e medidas administrativas para a
construção do Centro de Nefrologia em Santarém, com quantitativo de
máquinas necessárias, devendo a conclusão de todo o processo de
construção e início do funcionamento ocorrer no período máximo de cinco
meses subsequentes a esse período.
Porém, o processo ainda tramita na
justiça, sem qualquer definição, o que tem gerado motivo de muita
preocupação para os pacientes que sofrem de doenças renais crônicas, e
precisam de hemodiálise para sobreviver.
Por: Edmundo Baía Júnior